Manifestação de movimentos sindicais e partidos políticos, ligados ao pensamento de Esquerda na Avenida Paulista, em São Paulo, no mês de março de 2017. Crédito: Romerito Pontes/Flickr
As principais cidades do Brasil amanheceram com sua força de trabalho impactada pela convocação de uma “Greve Geral”; convocação realizada pelos sindicatos e partidos tradicionalmente ligados à Esquerda, como CUT, Força Sindical, APEOESP, PSTU, PCdoB e PT.
No entanto, a greve não foi tão “geral” como esperavam seus organizadores, nem tem o apoio da maioria dos trabalhadores afetados pelas reformas da Previdência e do Trabalho; o alvo principal do movimento grevista, ou, assim eles dizem…
Via de regra, “Greve Geral” era pra ser um negócio de maior impacto. A população como um todo, de empregadores à empregados, da iniciativa privada à pública, e enfim, todo o extrato social envolvido na geração de riqueza do país, precisaria concordar com a paralisação e suas bandeiras, para conseguir PARAR o país, de fato.
Isso não acontece, na minha humilde opinião, não porque as bandeiras anti-reforma não tenham força entre os trabalhadores de modo geral. Mas, muito mais, por uma total descrença nessas organizações, seus representantes, e as figuras políticas que cada lado suporta.
Como paralisar o país, de fato, quando a CUT leva – para desconforto de outros comandos de Greve, como a Força Sindical – o ex-presidente Lula para discursar em seus palanques, como o fez no último 15 de março???
Como esses movimentos são incapazes de compartimentalizar suas frentes e ideais (campanha na hora da campanha, reivindicação na hora de reivindicar, e etc.), tudo se contamina e, por mais que a “bandeira da vez” do movimento possa ter sua razão de ser, ninguém “de fora” adere, para não ser confundido com tudo de mau que permeia e se dissemina pelos tecidos desses movimentos.
A mídia, claro, vai vender isso com toda a força que puder. O dia será de imagens de bloqueios rodoviários, confronto entre Policiais e manifestantes, depredações, e todo o repertório típico.
E isto ocorre porque… Bem, porque você (nós) assiste (assistimos) e consome (consumimos)… E a mídia é “all about IBOPE”…. Noticiar já não basta. É preciso manter você entretido. Quanto mais caos, melhor… Então… Sim: As imagens vão ser repetidas em looping, por todos os ângulos e quanto mais bagunça, melhor (para quem vende isso, claro).
Toda meia-verdade é, também, uma meia-mentira…
Parece um título no padrão “jogo é jogo e, treino é treino” mas, vou “forçar a amizade” e dizer que isso é um pouco maior.
O governo Temer está certo em dizer que a Previdência precisa de reforma. Não importa qual a sua opinião, e não importa “de que lado você está”, o problema da Previdência é matemático e está cheio de fatos que o comprovam.
E você não precisa de um bacharelado em Economia para saber o que acontece quando sai mais dinheiro do que entra, em um dado caixa. Essa é a situação da Previdência. E não é passível de opinião. Basta olhar para os números.
A reforma que segue sendo discutida via PEC 287/16 não vai – como de costume nas reformas do nosso país – implementar metade do que foi previsto nela. Não há cacife político para enfrentar os sindicatos e as classes trabalhistas que são estrondosas em atacar a reforma. Mesmo assim, você precisa saber o porquê de reformar, da forma mais enxuta possível:
- O brasileiro está vivendo mais. Bom pra ele; péssimo para a Previdência.
No Brasil, segundo o IBGE, temos ~10% da população superando os 65 anos. A título de comparação, no Japão, um dos países com melhor estimativa de vida, 25% deles superam a marca.
No entanto, a Previdência Brasileira consome quase 10% do PIB do nosso país. Isso equivale a assustadores ~50% de despesa primária da União (aquela que afeta o endividamento líquido), todos os anos.
Imagine um orçamento em que metade paga direitos à pessoas que já não geram riqueza (Não significa que eu pense que elas não merecem. Mas, as contas não se importam com minha opinião, e seguem no vermelho). - A Previdência tem Superavit (sobra dinheiro). #SQN
Eu sei que você já ouviu isso: Não há dívida na Previdência. Ela recebe mais do que gasta.
Infelizmente (para todos nós), isso não é verdade, especialmente porque você precisa olhar como a Constituição Federal compõe o fundo previdenciário.
Também, é preciso dizer que a Previdência Pública opera em regime de repartição simples. Quer dizer que não há aplicação do dinheiro (como ocorre no VGBL ou PGBL), e ela só se mantém saudável se houver mais receita do que despesa.
Segundo a CF/88, a seguridade social agrupa a previdência social, a assistência social (mesmo para quem nunca contribuiu com o fundo) e a Saúde. Suas receitas são contribuições de empregados e empregadores, a contribuição social sobre o lucro líquido, a COFINS, o PIS-PASEP e um percentual sobre as loterias federais.
Ora! Se o que cada trabalhador e empregador pagam é mais que suficiente para manter a Previdência de todos os aposentados, por que então, o fundo tributa toda a sociedade com COFINS, PIS-PASEP e Loterias, desde sua constituição??? Porque sempre se soube que a conta não fecharia com o que se arrecada de cada trabalhador contribuinte (que, mais tarde, será um beneficiário). 🙂
E não se engane, dizendo que o problema está nas outras 2 partes que consomem o fundo: A Previdência consome 58% do montante arrecadado, deixando 42% para a Saúde e a Assistência Social dividirem.
Há, também o argumento dos desvios e corrupção… Certamente, a caixa d’água da Previdência lembra mais uma peneira, com tantos vazamentos e esquemas, mas, pra não entrar numa discussão enorme, o déficit da Previdência em 2016 foi de 257 bilhões de Reais (se considerar os cálculos otimistas do governo, “só” R$151 bi). Para falar de um mega-esquema de corrupção, estima-se que o rombo total da Petrobrás chegue à casa dos 20 bilhões.
Mesmo que o sistema previdenciário seja inteiro revisto (e deve, de fato, o ser), ainda faltarão “alguns” bilhões de Reais para que a conta feche. A reforma parece, portanto, inevitável. Não é culpa, somente, da corrupção. - Quer pagar quanto (e como)?
Não viva de sonhos: COM reforma ou SEM reforma, todos nós pagaremos pelo déficit. O dinheiro não será impresso (se for, vai dar m$@%&*).
E do que adianta gritar “tenho direitos!”, se o caixa estiver vazio? Se a Previdência falir, não importa o que você acha que merece. Não há dinheiro pra te pagar. Vamos ver se a ideologia gera notas de 100 reais, do nada.
Sem a reforma, o governo vai fazer o que sabe fazer de melhor: Aumentar impostos, criar novos, ou ambos (“ambos”, me parece o mais provável). Vamos pagar de qualquer forma.
Se não criar/subir impostos, vai emitir mais títulos de divida pública e aprofundar o endividamento do Estado. E vamos todos, como Nação, pagar juros a quem quiser comprar os títulos. Em algum momento, mesmo que não agora. Não há como o Estado brasileiro dar calote. Não, sem virar a Somália ou a Venezuela.
Se não fizer nada disso, resta ao governo imprimir dinheiro mesmo, o que significa “Inflação”: Você sai com seus mil reais que, por terem sido impressos sem geração de riqueza atrelada, agora valem 100. - “Os Militares de fora da PEC da reforma”, foi uma decisão correta, sim.
Não vou me estender muito mas, você precisa saber que a CF/88 trata da Previdência de servidores públicos civis, por simples pressão classista.
Durante a composição da CF/88, seus sindicatos e seus parlamentares cederam à pressão e incluíram proteção com status constitucional para essas classes.
Mas não é o caso dos militares. Os militares têm sua aposentadoria regulada por lei ordinária, e não pela Constituição, e isso é ótimo.
Na verdade, deveríamos lutar (eu e você, que não temos regalia [eles preferem o termo “Prerrogativa”; é menos vergonhoso] alguma como quinquênios, licença Premium, readaptação e tantas outras firulas que fazem a aposentadoria, de fato, chegar bem mais cedo para o setor público, mesmo que não no papel) para que toda a regulamentação de aposentadoria do funcionalismo público fosse removida da Constituição.
Estar lá significa ter mais proteção contra reformas, mais mecanismos de impedimento à reformas, e mais trabalho para se corrigir qualquer desvio. Incluir militares na PEC seria dar à eles todo esse respaldo que servidores públicos civis já contam.
Ou seja: Militares teriam mais proteção à sua aposentadoria. Não significa que os militares não devam ter seu modelo de aposentadoria revisto (por que diabos parece sensato que a filha de um militar ganhe pensão se for solteira?) mas, não, não nessa PEC e não agora. - Se o remédio amargo não for tomado agora, ele vai amargar ainda mais, logo ali na frente.
É uma ilusão tremenda, típica do endividado crônico, fingir que se não encararmos o problema agora, e o escondermos por debaixo dos panos, ele se resolverá sozinho. Como em todo problema crônico, o tempo é amigo do monstrinho que vai crescendo em baixo da cama.
Podemos não reformar agora. Podemos fazer como fizeram os últimos governos brasileiros, com anuência da sociedade, claro.
Podemos empurrar essa situação até o limite, quando ela consumir 70, 80% da despesa primaria da União.
Podemos.
Mas, uma hora, com direito garantido por lei, e decisão favorável do Juiz, seu pai, sua mãe, seus tios, e até você, vão bater na porta da Caixa Econômica e vão encontrar a conta zerada. Pode espernear, tacar fogo em pneu, parar o transporte público. Não vai ter verdinhas. Ponto.
Se não isto, então, impostos novos vão aparecer para cobrar de você, de qualquer forma, o que a reforma não corrigiu e não equalizou. E com mais impostos, é mais difícil rastrear pelo que você está pagando, e mais difícil de melhorar a tão criticada regra tributária brasileira que impede novos empregos e afunda o país em atraso e desemprego (também).
O problema não irá desaparecer. Irá piorar.
Não precisa ser genial pra saber disso: Deixe seu financiamento imobiliário atrasar, e volte daqui três meses para ver se a dívida melhorou. Talvez, você já esteja sem um teto, até lá.
Por que seria diferente com as contas públicas? Ainda com dúvida? Pergunte ao compatriotas cariocas, como anda a vida no Rio…
Mas, qual é a meia-mentira?
Bem, eu disse que toda meia-verdade é também, uma meia-mentira.
A meia-verdade: A reforma da Previdência é tão necessária quanto a reforma Trabalhista. Não há como negar que a primeira precisa ser feita para salvar o modelo de Previdência pública, e a segunda continuará a agredir a geração de empregos, se não for feita.
A meia-mentira: Todos vão pagar o preço, como uma sociedade unida o faz, em momentos difíceis. Eu riria, não fosse a dor da úlcera de saber que só nós, os sem privilégio político ou de classe, vamos pagar o preço.
Nós, da “classe média”, aquela que o último governo classificou como “ganhando mais que R$1.164,00 mensais” (SAE 2014).
Os políticos: Não, eles não vão pagar o preço. Continuam nos melhores hotéis de Brasília, continuam com vale-paletó, vale-combustível, vale-torradeira, vale-máquina-de-lavar… Cobram o favor, a obrigação, o que deviam fazer e o que não deviam. Cobram pra ficar quietos, para falar, para serem bons e ruins. Cobram para tudo. E, claro, nunca farão nada que vá contra a sua capacidade de se grudar ao poder, e sugar tudo de bom que há nele, como carrapatos que parasitam um animal… O mais triste é que, nessa analogia, o “animal” sofre de síndrome de Estocolmo, e até luta para manter certos carrapatos mais famosos, se alimentando dele…
Os sindicalistas: Não, eles também não vão pagar o preço. Continuam com fartos salários, pagos via imposto sindical (recentemente removido, e um motivo real de tanta indignação dos sindicatos com o governo, bem mais do que a estória do “Nenhum direito a menos”), via lavagem de dinheiro, corrupção, frutos de acordos espúrios com os Empregadores das cadeias mais poderosas da Indústria nacional, e representantes de todas as esferas do poder Estatal… Comandam uma massa de manobra gigante, cega, barulhenta e violenta…
Os funcionários públicos: Não, eles também não vão. Já mostraram que mandam no país, sequestram o poder público em benefício da classe e benefício próprio; fecham, proíbem, atrapalham, atravancam toda a vida em sociedade, em todos os seus aspectos, caso sejam contrariados. Se, por um lado, são trabalhadores como quaisquer outros da iniciativa privada, por outro, detém funções com a qual a vida em sociedade não se sustenta sem, como o esparadrapo no pronto-socorro, a escola pública que precisa conceder o diploma, o passaporte que precisa ser emitido para se trabalhar e estudar, a Lei que precisa ser mantida, e tudo mais para qual o monopólio Estatal não pode, por inúmeras razões, receber as benesses da competição privada. Sabem o que sequestram, e sabem quem e o que fazer de reféns para manter tudo como está. Conservadores como qualquer partido de Direita, mas, com a desculpa de “lutar pela manutenção de direitos”…
Você, eu, todos aqueles que não tem poder visível (demonstrável) de eleger e remover do poder; alguém que, sem mérito ou conhecimento, decide os rumos do Estado brasileiro e de nossas vidas… Nós, sim, vamos pagar (todos) o(s) preço(s).
Então, essa é a meia-mentira. A de que somos iguais perante a Lei se comparados com todos esses outros, e que todos nós vamos pagar solidariamente, os custos da reforma de algo que foi quebrado não por um ou por outro, mas por todos até aqui. Não vamos… Ou melhor, só nós vamos…
Se correr o bicho pega, e se ficar o bicho come…
O xeque-mate está ali na esquina.
Você não gosta nada da reforma, seja porque não vê necessidade, ou porque não concorda em ser o único a realmente pagar o preço dela (fato com o qual eu concordo, também).
Por outro lado, a única turma fazendo barulho contra, é a turma que se alimentou das entranhas do poder – grosso modo – na última década.
Uma turma que usa o idealismo e o sonho de um mundo socialmente mais justo de seus filiados menos influentes e mais fiéis à causa, para fazer uma tropa de choque para-militar que quebra patrimônio público e causa a disrupção de serviços e direitos elementares (como o ir e vir Constitucional; superior ao direito de Greve, só pra constar) de todos nós, em nome dos interesses de alguns poucos caciques que deveriam estar presos pelo que fizeram e fazem, mas seguem “dando as cartas” no dia-a-dia do Poder, e discursando em palanques.
Eu, do fundo do coração, acredito no instituto legal da Greve como instrumento legitimo e digno, sim, de controle e equilíbrio das forças que o Capital confere – inegavelmente – ao Empregador; poder que esvazia-se no empregado.
Mas, de modo algum, eu teria coragem de reclamar de pagar essa conta sozinho, inflando os números em uma avenida, para que Lula ou qualquer outro safado subisse num palanque, na minha frente, e em desrespeito ao código eleitoral, fizesse pré-campanha para a Presidência em 2018, com eu, ali, dando quorum, ao menos visual, para as bobagens e mentiras que ele gosta tanto de dizer (Os safados da dita “Direita” [embora eu sofra em achá-la às claras, por aqui]… Os Aécios, Renans, Alckmins e todos os outros; estes não precisam do palanque, agora… Estão felizes como tudo segue e só por isso, não vão às ruas como o ex-presidente vai).
Estamos numa cilada. Vamos pagar a conta sozinhos. E não tem bandido e mocinho, mas só bandidos, pedindo nosso apoio ou repúdio, não em nome dos verdadeiros valores de igualdade e justiça social, mas, para atender à interesses completamente privados.
Esta é, ao meu ver, a estarrecedora situação da representatividade de cada um de nós, diante do Poder público, nos dias de hoje. E explica porquê é tão difícil entender para que lado “a corda puxa”, e para que lado ela vai chicotear.
Mas, deixe-me fazer uma única previsão final: Como sempre, essa corda vai chicotear para quem, proporcionalmente, recolhe mais impostos, e recebe menos benefícios do Estado… Nem o magnata do Petróleo, nem o miserável do programa assistencial…
Ela vai acertar bem no meio do nosso extrato social. Bem em nós. Como de costume.
E eu nem precisei de uma faculdade para prever isto.