Sobre o assalto a Portela

créditos da imagem: Secretaria Especial do Esporte - Mundial de Baku
Aviso: este é um artigo de mera opinião. Logo, ele foge um pouco da lógica que consiste em apresentar fontes para as “grandes” afirmações, como faço por aqui. Você é bem-vindo(a) para pedir alguma fonte para alguma afirmação se quiser/precisar, e farei o possível para apresentá-la(s) a você.

Falar em “Justiça” é sempre complicado. Quem estuda Direito, então, pode lhe apresentar mil teses sobre “o real significado de ‘Justiça’”. Todas elas postulando, é óbvio, que sabem “a verdadeira verdade”.

Para uns, “Justiça” é fazer com que a Lei seja aplicada cegamente, doa a quem doer. É evidente, para mim e tantos outros, que esta concepção ignora a complexidade do mundo real e das circunstâncias que nele se desdobram, gerando, fatal e inexoravelmente, injustiça.

Para outros, “Justiça” é proteger o mais fraco em detrimento do mais forte. Por mais romântica quanto essa ideia possa soar, é evidente – com base em fatos históricos, inclusive – que sociedade nenhuma pode prevalecer se as “regras do jogo” são sempre subjetivas, e os direitos e obrigações dependem majoritariamente da “hipo” ou “hipersuficiência” das partes envolvidas.

Batido conceito em todo santo semestre da faculdade de Direito, lá vem Aristóteles definir o que é “Justiça”. E, frequentemente, sumarizam seu pensamento (que é mais complexo e mais profundo do que uma frase) assim: “Justiça é tratar os iguais, igualmente; e os desiguais, desigualmente, na medida de suas desigualdades”.
Este último conceito é o mais aceito como a definição “contemporânea” (bem antiga, por sinal) de “Justiça”, e é por este e outros motivos que o Direito do Trabalho – só por exemplo – tem o preceito basilar de “hipossuficiência do empregado” ante ao empregador; regra que, claro, comporta exceções.

Daí, aquele(a) mais espertinho(a) em pesquisa na internê, corre lá na Constituição e se apressa em compartilhar que assim diz o art. 5º da Lei Maior: “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza(…)”.
E truca…
E perde…

O problema de uma Lei que não foi escrita para ser acessível a todos é que a hermenêutica jurídica (palavra bem bonita/mala para “interpretação da Lei”) não permite a leitura de um artigo “solto”, sem compreender o sistema em que este artigo está imerso.

Logo, nenhum direito é absoluto. Nenhuma regra é concêntrica (ou seja, sem exceções). Nenhuma decisão é irreversível (não sem vários meios de questioná-la, e mesmo depois de “sentença que transitou em julgado”, o Direito ainda prevê mecanismos onde se admite revisitar tema já encerrado. [Nesses temas, o Direito corrente costuma falar sobre “Ampla defesa”, “Contraditório” e “Devido processo legal”, caso você deseje saber mais).

Mas, claro: isso são as exceções já que, como dito anteriormente, a sociedade não poderia viver com regras absolutamente subjetivas e que mudam ao gosto do freguês (a isto, o Direito dá o nome de “insegurança jurídica”; condição danosa à sociedade e à economia de qualquer nação). Pior do que uma regra ruim, é a regra que ora se aplica, ora não, a depender de condições completamente imprevisíveis.

E, depois de tudo isso, é bastante importante esclarecer que advogados não lutam primariamente por “Justiça”. É claro: se você já viu a entrevista de um advogado após, digamos, a inocência de seu cliente ser corroborada em juízo, ele sempre dirá “o que se fez, aqui, foi justiça!”, ou coisa que o valha.
MAS… Mas, advogados realmente lutam por direitos. E direitos nem sempre são justos.

E “Justiça” não se confunde com “Direito”. O dono de um terreno de vários quarteirões tem o direito de reaver o imóvel ocupado por dezenas de famílias carentes (em regra; portanto, há exceções). E isto nem sempre será justo, já que a propriedade deve atender à sua função social, conforme preceitua o inciso XXIII do mesmo art. 5º, da mesma Constituição Federal (que também não se pode ler de forma não-sistemática). Por outro lado, um cidadão com apenas um terreno pequeno, morando de aluguel em outra cidade, a trabalho, pode se ver em um processo que consumirá muito tempo e muito dinheiro para reaver um imóvel invadido por espertalhões ou mesmo criminosos. Novamente, a realidade supera em muito a capacidade de criar hipóteses, e em cada uma delas, descobriremos que nem sempre o que é certo é legal, nem o que é legal é certo. Essa divisão costuma mexer com a cabeça dos futuros advogados. É uma relação conflituosa desde que os ideais se chocam com a necessidade de pagar boletos (“boletos”, sim, porque sou cringe e ninguém os paga por mim).

Se entrarmos em um clássico terreno de desavenças entre jusnaturalistas (que seguem muito aos “contratualistas”, como Locke e Hobbes, mas especialmente a Rousseau) e juspositivismo (muito ligados à Teoria Pura do Direito, de Hans Kelsen), teremos todo um complexo tabuleiro de ideias para destrinchar. Chegaríamos aos extremos de que uma Lei, ainda que legitimamente erigida, deve ser sumariamente desrespeitada caso não seja “justa” (com toda a complexidade e inexatidão que cabe nessa palavra). Do outro lado, veríamos que se a Lei lhe permite fazer mal ou, simplesmente, não impedir que o mal ocorra, ainda assim, você será justo ao fazer o mal ou deixar de impedí-lo).

Por que toda essa ladainha?

Bem, porque Maria Portela, atleta olímpica do JuDo (são duas palavras/ideogramas[kanji]: “Do” = Caminho/Escola; “Ju” = Suavidade/Gentileza) brasileiro na categoria até 70kg, sofreu um assalto. Para facilitar, vou seguir com a grafia em português que é “Judô” .
E, já que iniciamos falando em Direito, vale compartilhar que não existe o crime de “assalto”. Os crimes contra o patrimônio, vistos no código penal são, geralmente, o furto (quando o objeto é subtraído sem violência ou grave ameaça) no art. 155, ou o roubo (quando o objeto é subtraído mediante violência ou grave ameaça), no art. 157. Há outros, claro.

“Assalto” é um conceito quanto à forma de agir. “Tropas de assalto” não são tropas militares criminosas, mas tropas com técnicas de assalto o que, basicamente, significa “pegar o adversário de surpresa”.
Afirmar que os árbitros do dia 28 de julho (no Japão) “roubaram” Portela, poderia me levar a responder por outro crime, o de Calúnia (quando se imputa fato típico [crime] contra alguém, falsamente), art. 138 do CP. Claro: ninguém vai ser processado por chamar o árbitro de futebol (ou de qualquer esporte) de “juiz ladrão” … A Lei ainda não é tão frívola. Ainda.

Mas, se eu disser que “roubaram” a Portela, estarei também dizendo que houve uma intenção danosa, uma vontade de cometer o mal à atleta. E é muito difícil afirmar isso, exceto em casos notórios e igualmente infames de árbitros que aceitaram algum tipo de vantagem ou promessa benéfica em troca de um favorecimento indevido aos mandantes (o que, basicamente, caracteriza a corrupção passiva; mas esta figura típica se destina ao agente público, havendo diploma para tratar do caso entre CNPJs… Outro dia, outro post).

“Assalto” parece mais correto. Portela fazia uma luta difícil, mas dentro de uma certa normalidade e, de repente, de assalto, foi duplamente punida pela arbitragem (em momentos distintos da luta) que se desviou do que era esperado por milhares de espectadores (uma pesquisa feita por uma atleta da modalidade resultou em 97% de participantes opinando que houve waza-ari [explico o termo, depois]). Daí, podemos dizer que ocorreu “insegurança jurídica” no mundo do Judô; claro, abusando agressivamente das analogias entre as áreas.

Talvez eu devesse ter feito isso antes, mas faço agora: fui judoKa (neste contexto, “Ka” = praticante. Mas, seguirei com a forma aportuguesada, “judoca”) no início da vida adulta, por três anos, aproximadamente. Ainda amo o Judô, mas não o prático mais por N circunstâncias da vida, incluindo carreira, obesidade, problemas, outros sonhos que pediram passagem, e por aí vai.

Não tive a oportunidade de iniciar cedo no Judô, como ocorre com a maioria dos que praticam a arte. Não morava em um local que permitisse isto (a academia mais próxima devia ser na Penha, a Associação de Judô Messias, local tradicional, conhecido por quase todos os judocas de SP; e eu morava na Cidade Líder/Itaquera); nem meus pais tinham as condições para manter esse tipo de atividade extracurricular nas agendas de meu irmão e nas minhas (se um tem, o outro também tem que ter – essa era a Lei).

Mais que isso: você geralmente gosta mais daquilo que conhece e é exposto. Daí a importância de incentivar seu(sua) filho(a) a ler, primeiro pelo exemplo (leia para ele, tenha livros por perto, na mesa do escritório ou da sala, mesmo sob o sacrilégio de não lê-los). No início da década de 90, não existia exposição a outra coisa que não o futebol. TV a cabo? Você está louco(a). Internet? Quase dez anos adiantado(a)… E eu não gostava de futebol. Então, os esportes demoraram um pouco para entrar nas minhas paixões e, até hoje, o futebol é a menor prioridade na lista que inclui várias modalidades como futebol americano, natação, vôlei (pelo qual tenho enorme carinho, mas fica para outro dia) e, claro, o Judô.

Suponho que ainda que meus pais tirassem recursos de onde não tinham para me pôr, digamos, no Judô (ou qualquer coisa diferente do trivial), o provável é que eu desanimasse e perdesse o interesse por não ter o nível necessário de incentivo ao meu redor. Nenhum primo com quem eu convivia fazia; nenhum amigo da escola (todos tão pobres ou ainda mais pobres do que eu). Esse ambiente é excelente para desistência de qualquer criança, em qualquer atividade. Elas já desistem de estudar o que são obrigadas a estudar (novamente, muito pelo que recebem de incentivo no meio em que vivem). Imagine algo que não é mandatório.

Com a vida adulta, o primeiro emprego formal e um pouco mais de constância, o Judô foi um lugar encantador num passado um tanto quanto turbulento com minha depressão, alguns sintomas de síndrome do pânico, e caos por todos os lados da vida. Sou eternamente grato ao Senpai ( = aluno mais experiente) Fernando de Bem, e ao Sensei Roberto Forte Katchborian e, claro, todos os demais Senpais e Kohais ( = o oposto de “Senpai”), pois, sem eles todos, eu jamais poderia amar o Judô.

Em específico, agradeço ao Fernando por me convencer a assistir ao primeiro treino, me oferecer o DoGi ( “Gi” = uniforme. O nome completo seria “judo-gi” [ou karatedo-gi, se for um traje para Karatê, e assim vai…]) emprestado. E, até hoje, a “minha” faixa branca não é minha, mas dele, emprestada também. Se é emprestada, Fernando, significa que ainda é e sempre será sua. Peça de volta quando quiser, pois, uma faixa carrega muitas histórias. O desgaste dela nos lembra das horas no tatame, e de toda dificuldade para alcançar o próximo Kyu (= “grau de iniciantes”), até chegar no 1º Dan (faixa preta, com “Dan” também significando “grau de perícia”), momento em que, dizem os judocas, “o Judô começa, de fato”.

Depois, agradeço ao Sensei Katchborian por tantas lições, aperfeiçoamentos, bondade, sabedoria, sensibilidade e mentoria. Um verdadeiro mestre adequa sua forma de ensinar ao ritmo, possibilidade e dificuldade de cada aluno, e não acredita em fórmulas mágicas ou em “ensino quadrado”, tentando empurrar o conhecimento de qualquer maneira. Espero, quem sabe, ainda poder voltar a treinar com meu mestre e concluir a formação básica. Depois da faixa branca, cinza, azul, amarela e laranja alcançadas, ainda faltam três Kyus (concluir a transição para a verde [que havia iniciado, mas parei] o que leva um ano, normalmente; depois, estar em nível com a roxa, o que pode levar dois anos; e por fim, alcançar a faixa marrom, onde o judoca fica, em média, três anos antes de se avaliar o preparo deste para tentar obter o Dan; contudo, este é o caso geral e cada caso concreto é único). Só então estarei pronto para pleitear meu primeiro Dan.

Com Sensei Katchborian também aprendi sobre os três grandes pilares do Judô:

  • 1) Seiryoku Zen’Yo; tudo o que fazemos (no Judô e na vida) deve visar a máxima eficiência. Derrubar um adversário que pesa 100kg é sempre difícil. Faça da forma mais eficiente possível. Ao lidar com um problema na sua vida, resolva-o da forma mais racional e efetiva possível. É uma filosofia de vida e, por ser assim, é algo que o judoca persegue a vida toda, sempre imperfeitamente, mas sempre passível de se aperfeiçoar.
  • 2) Jita-Kyouei; Meu treino e minha luta só são bons na medida em que são bons para o aprimoramento de meu adversário e/ou colega de treino. A solidariedade humana importa ao judoca que leva o Judô a sério.
  • 3) Ju; a suavidade que o Judô prega nada tem a ver com a ausência de esforço. Mas, sim, com os movimentos mais eficientes quanto possível, para vencer o adversário. Às vezes, vencemos ao ceder a uma força maior que a nossa, e não ao nos opormos a ela (oposição que nos levaria à derrota, provavelmente).

Sem os Senpais e Kohais simplesmente não há treino, já que não é possível treinar Judô sozinho. Você até pode fazer algumas partes do treino individualmente, mas a parte em que realmente aprende é a parte em que enfrenta os adversários que o ajudam a ser melhor, como você os ajuda também.

E, mais uma vez, você se pergunta: “Onde diabos esse texto está querendo chegar?”. É uma pergunta justa. Eu tinha duas missões até aqui: 1) Compartilhar como o Judô se organiza e alguns conceitos básicos da arte, para que o texto tenha alguma valia para quem se dedicou a lê-lo; 2) mostrar que não estou falando de algo cuja ignorância não permitiria ver um palmo à frente (já que não cito fontes até aqui, você precisa confiar que eu sei sobre o que falo; e isso é sempre perigoso).

De volta a Portela

Maria de Lourdes Mazzoleni Portela, nascida em 14 de janeiro de 1988, em Júlio de Castilhos, Rio Grande do Sul, é uma judoca com trinta e três anos e meio, formada pela tradicionalíssima SOGIPA (Sociedade de Ginástica de Porto Alegre) que manteve em seus quadros os nomes que ficariam conhecidos no Judô mundial, inclusive revelando alguns deles, como João Derly (bicampeão mundial [2005 e 2007]; campeão pan-americano [2007]) e Tiago Camilo (campeão mundial [2007]; tricampeão pan-americano[2007, 2011, 2015]; duas medalhas olímpicas [prata em Sidney/2000 e bronze em Beijing/2008]).

Atualmente, conta com Mayra Aguiar (bicampeã mundial[2014 e 2017] mais cinco medalhas mundiais [prata/2010, bronze/2011, prata(equipes) e bronze/2013, bronze/2019]; campeã pan-americana [2019] e mais três medalhas [prata/2007, bronze/2011 e prata/2015]; e que acaba de conquistar o terceiro bronze olímpico, agora em Tóquio/2020 [os outros dois em Londres/2012 e Rio/2016], sendo a primeira mulher brasileira com três participações com medalha em esporte individual, em olimpíadas), Érika Miranda (três pratas em mundiais [2013/2013 {equipes}/2017] e quatro bronzes [2014, 2015, 2017, 2018]; além de campeã pan-americana em 2015 e outras duas pratas [2007, 2011]), Felipe Kitadai (bronze olímpico em Londres/2012; prata no mundial 2011; campeão pan-americano em 2011 e prata em 2015)…

…e, claro, Portela (duas vezes medalhista mundial [prata/2017 e bronze/2019] e duas medalhas no Pan-americano [bronze em 2011 e 2015]), filha da casa.

Conhecida na seleção nacional de Judô pela alcunha de “raçudinha”, Portela é um verdadeiro tanque de guerra em forma de judoca. Assistir suas lutas é ver um espírito combativo muito alto. Ela raramente se cansa antes do golden score (prorrogação) e busca o combate o tempo todo, até quando poderia simplesmente administrar a vantagem.

Mas, no dia de 28 de julho, em Tóquio, Portela seria desclassificada por excesso de shidos (faltas, cuja terceira gera a desclassificação do(a) atleta) após quatro minutos do tempo regular e quase onze minutos de golden score (prorrogação em que o primeiro atleta a marcar, vence. Não há limite máximo de tempo).

A desclassificação por shido, em si, não é polêmica, acontecendo com regularidade nas competições, com maior ou menor frequência, a depender do espírito da arbitragem naquela competição. Esse espírito se altera para mais rigor, ou menos rigor, conforme a crítica especializada e leiga comenta os últimos torneios. A IJF (International Judo Federation) está sempre tentando tornar o Judô mais atrativo ao grande público. Na minha nem tão modesta opinião, às vezes, às custas da alma do Judô; como quando baniu alguns golpes que compunham o Go Kyo (os quarenta golpes fundamentais do Judô, criados e esquematizados por seu fundador, Sensei Jigoro Kano, em 1882).

Entre as evoluções (lembrando que “evolução” não é sinônimo de “melhora” [pergunte para alguém que evolui a óbito; ou melhor… Tente perguntar…]), eliminou-se as notas “Koka” e, mais recentemente, “Yuko”. O atual sistema de notas é composto por apenas dois critérios: Ippon (o golpe perfeito, que termina o combate imediatamente) e Waza-ari (um “Ippon imperfeito”. Dois waza-aris encerram o combate). O tempo regular de combate caiu de 5 para 4 minutos, e shidos não desempatam mais as lutas (embora possam eliminar o adversário, como aconteceu com Portela). Tudo para tentar tornar a luta mais dinâmica e mais “viva” para o público em geral.

Portanto, ninguém “dá Ippon” em ninguém. Ippon é uma pontuação que depende da perfeição com que um golpe é aplicado. Assim como Waza-ari também não é um golpe, mas sua pontuação (e que se pronuncia como “uazaari” e não “vazari”, como lamentavelmente todo narrador e até judocas dizem por aí). Até existe um golpe chamado de “ippon seoi nage”, mas quando judocas abreviam o golpe, se referem a ele como “seoi nage”. Então, de agora em diante não diga “ele deu ippon”. Pode dizer, porém, que “ele(a) jogou o adversário de ippon” (analogamente a quando dizemos que alguém fez um gol “de placa”); porque a projeção efetuada se deu com perfeição e gerou um ponto perfeito, o ippon. Ippon e waza-ari adjetivam o golpe realizado. Não são golpes em si.

Abaixo, o nome dos golpes incluídos no Go Kyo (há mais golpes, esses são os principais para projeção [nage waza]. Há, ainda toda uma parte de solo/imobilização [ne waza] e toda a parte de chaves [kansetu waza] e estrangulamentos [shime waza]):

direitos de imagem: https://commons.m.wikimedia.org/wiki/File:Gokyo-no-waza.jpg

Então, onde reside a polêmica que leva Portela a ter sido “assaltada”?

Portela fez uma luta boa. Mas sua adversária, Madina Tamaizova do Comitê Olímpico Russo (ROC) – já que a Rússia está punida pelos escândalos de dopping e não pode atuar nos jogos olímpicos com a bandeira nacional – também foi sobrenatural. Na realidade, conforme a história do dia 28 se desenvolve, o brasileiro que entende de Judô passa de ódio para perplexidade, terminando até mesmo em admiração pela capacidade de superar a dor que Tamaizova demonstrou. MAS, vamos devagar…

A luta entre Portela e Tamaizova era o round de 16 avos da final. Depois, obviamente, vinham as oitavas de final e assim por diante. Nos campeonatos atuais de Judô, não há “fase de grupos” … Você entra e se perder, está fora. Fim de papo. A repescagem surge nas quartas de final, e o Judô geralmente premia quatro medalhas, sendo um ouro, uma prata e dois bronzes (os perdedores das semifinais enfrentam os vencedores da repescagem, pelos dois bronzes à mesa).

A primeira luta de Portela foi contra a afegã do time de refugiados, Nigara Shaheen (que não consta no ranking IJF em suas primeiras cem posições), e foi vencida em altíssima velocidade pela brasileira que ocupava a nona posição no ranking mundial da IJF para mulheres até 70kg, sua categoria e a categoria do dia nas Olimpíadas de Tóquio. Um belíssimo sode-tsurikomi-goshi foi aplicado com apenas 28 segundos de luta. Golpe muito plástico e de execução perfeita por Portela. Ippon. Fim de combate.

Do lado da Tamaizova, naquele momento, décima segunda do ranking IJF, a russa enfrentaria, na primeira luta, Maria Bernabeu, espanhola, décima oitava do ranking IJF naquele momento. A luta foi vencida por um soto-makikomi imperfeitamente executado, que resultou em um waza-ari para a russa ao primeiro minuto e sete segundos, e a luta durou os quatro minutos típicos e previstos.

É evidente que enfrentar uma refugiada que não treina regularmente é comparativamente mais fácil do que enfrentar a décima oitava da categoria na IJF, embora o ranking tenha uma série de imperfeições em seu sistema de ranqueamento, mas não cabe discutir isto por aqui, agora.

Então, chega a luta fatídica: Portela e Tamaizova. Trinta e três anos e meio do lado brasileiro, vinte e dois anos do lado russo. 1,58m do nosso lado, 1,69m do lado adversário. Ambas no limite da marca de 70kg (embora a realidade não seja bem essa).
O arbitro foi o Sensei (todo arbitro de Judô também é judoca) Everardo Garcia, do México. Não tenho os dados dos árbitros no VAR/banca.

E a luta foi assustadora. Quatorze minutos e cinquenta e oito segundos de duração. Basicamente, três lutas em uma.

Nos primeiros quatro minutos nada de realmente grande ocorreu, mas, já era visível que os trinta e três anos de Portela lhe rendiam mais astúcia e controle na luta contra a novata de vinte e dois anos. Portela teve, certamente, mais volume de luta. Tanto que o primeiro shido (punição) saiu aos 4m35s para a russa, por evitar a pegada (o que é um “antijogo”). Porém, cinco segundos depois, o mesmo shido foi dado a Portela. Nesse tempo, já estávamos em golden score. O primeiro ponto, waza-ari ou ippon, encerraria o combate, portanto.

O polêmico golpe não concedido à Portela foi desferido aos 3m02s do golden score (portanto, 7m02s no total); um eri-seoi-nage, imperfeito, já que as costas da russa não atingiram totalmente o chão, mas ela acertou o tatame de um ombro ao outro (rotacionando a omoplata contra o solo) e em alta velocidade. O arbitro não concedeu o waza-ari à brasileira, emitindo o comando de “mate” (que interrompe o combate) e acionou o VAR para revisão. Após quase um minuto, o waza-ari seguiu não concedido.

O que diferencia um waza-ari de um ippon?

Talvez, aqui, caiba uma pequena pausa para classificar ippon e waza-ari, quanto a pontuação de um golpe.

Conforme preceitua o documento “IJF Sport and Organisation Rules (SOR, Version 8 October 2019)”, um ippon é a aplicação perfeita de um golpe de Judô. Essa perfeita aplicação requer quatro critérios: a) Força; b) Velocidade; c) Queda do adversário sobre as próprias costas; d) Controle habilidoso sobre a queda do adversário até o contato deste com o chão.

Portanto, o arbitro avalia o domínio da técnica pelo Tori (quem arremessa), e controle da queda sobre o Uke (aquele que cai), fazendo com que este último atinja o solo com as costas “chapadas” contra o tatame, de maneira completa. A velocidade e a fluidez do golpe também importam.

Já, um waza-ari é um golpe em que algum dos quatro elementos (ou até mais de um), acima, está incompleto. O controle da queda não era pleno, as costas não atingiram o chão completamente, não houve velocidade suficiente, e por aí vai.
Para mais detalhes, consultar páginas 116 a 118 do referido manual (em inglês, no site da IJF).

Voltando ao combate

Portela projeta Tamaizova através de um sode-tsurikomi-goshi a 3m02s do golden score. A atleta cai com o ombro direito e, depois rola até o esquerdo. As definições típicas de um waza-ari estão caracterizadas, na minha opinião, opinião inclusive embasada nas descrições do documento da IJF. A atleta russa chega, ainda, a usar – intencionalmente ou não – o pescoço durante a queda; algo que, se realmente caracterizado, acarreta a desclassificação (“hansokumake”) da atleta russa pelo perigo à coluna dela mesma. Só lembrar do segundo princípio do Judô, o Jita-Kyouei.

E, não se enganem, porque eu não me engano. Em conversa com amigos, eu já havia dito que não acreditava em medalha de ouro para Portela. Especificamente, eu disse a eles: “Portela tem poucas chances reais de lutar por prata/ouro, mas o bronze não é impossível. A luta dela é a oitava no tatame feminino. As favoritas do 70kg são Van Djike(HOL) e Pinot (FRA), com Arai (JAP) correndo por fora. A Portela pega uma afegã do time de refugiados, e é esperado que ela vença essa, ao menos”.

Então, não. Nunca achei que Portela seria ouro em Tóquio. Aliás, eu acho até que demandar o bronze dela, ou de qualquer atleta é um defeito de quem assiste a uma competição olímpica (“demandar” é diferente de “achar possível”).

Uma olímpiada tem um complexo ranqueamento para a qualificação do atleta aos jogos, logo, ninguém ali é muito fraco. Claro que há o time de refugiados, o país sem qualquer tradição na modalidade, etc., etc., etc…. Mas, mesmo assim, quando olhamos, por exemplo, um brasileiro em décimo lugar numa lista de dez competidores olímpicos, é ignorância reduzir o pensamento a “ele(a) ficou em último(a)” . No ranking olímpico, sim. No ranking do mundo, absolutamente não. Porque onde ele(a) se classificou, centenas e até milhares não conseguiram.

Em modalidades como a natação, por exemplo, muitas vezes a diferença entre o ouro e o sexto lugar, digamos, está na casa dos centésimos de segundo. O medalhista de ouro, na categoria masculina, Caeleb Dressel (EUA), fez os 100m nado livre em 47s02c, e o sexto lugar, Alessandro Miressi (ITA), fez em 47s86c… Mesmo do primeiro para o último colocado na final, a diferença foi de um segundo e oito centésimos. Isso mesmo. O tempo que você levou para ler a última frase é o que separa o campeão e aquele que você, talvez, considere um perdedor.

É claro que atleta nenhum sai de casa, rumo a uma olímpiada, desejando ficar fora do pódio. Mas estar lá já o credencia a dizer que ele pertence à elite esportiva mundial. Você concordando com isso ou não.

Mas, o que realmente frustra no caso Portela é a ambiguidade. A “insegurança jurídica” é o que corrói. Eu consigo apontar N quedas muito similares, senão menos características do que aquela, e demonstrar que as comissões de arbitragem declararam o waza-ari.

Mais do que isso: se a atleta russa defendeu a queda usando o pescoço para evitar o rolamento sobre a omoplata (o que seria waza-ari), então, ela deveria ser imediatamente desclassificada por hansokumake. E se não usou o pescoço, então o que DIABOS ela fez para bater o ombro direito e não rolar as costas inteiras até o esquerdo? Qual mágico movimento ela pode ter performado que não envolveu a ponte com o pescoço ou o rolamento por sobre toda a omoplata?

Leandro Guilheiro, que ainda atua na preparação dos atletas do Judô brasileiro alegou que, em apuração com um membro do comitê de arbitragem, seu contato disse que é pacificado que aquela queda não deve ser pontuada. E, novamente, não se enganem: o Judô de alto nível, como quase tudo que fica grande e mundial, tem muita politicagem. É muito difícil que um arbitro oficial acuse outro arbitro oficial de equívoco no julgamento. Qualquer semelhança com o judiciário brasileiro é mera coincidência.

O que resta?

Não resta nada. O estrago foi feito. As entidades desportivas brasileiras se acovardaram ao não tomar uma posição propositiva em prol da atleta; como sempre fizeram e como sempre farão, de seu patamar e postura sempre servis, sempre subalternos.

Eu me recuso a reprisar as imagens do choro comovente de Portela. Ela sofreu como sofre a vitima de um crime. E foi um crime. Não em sentido estrito, claro. Mas em um sentido emocional. Humano. Ético, por que não?

A história de TODO atleta – do nosso lado e do lado de lá – envolve muito sacrifício, escolhas difíceis, quase sempre muita dor. Em esportes como o Judô, as lesões são ingratas companheiras na jornada, quase sempre certas numa longeva carreira.

Esporte pode até ser sinônimo de saúde. Não o esporte de alto rendimento, contudo. Não há nada de saudável no esporte de alto nível, e não acredite em quem diz que há.

O dopping é uma das faces do “melhoramento humano” que o esporte de alto nível pode incentivar (especialmente, quando a medalha é tudo o que importa para uma dada cultura desportiva, pressões por resultados, dos torcedores, dos patrocinadores, do Estado [como no caso russo]).

Outra face são as lesões que deixam marcas permanentes (de dor na aposentadoria, de mobilidade reduzida), os tratamentos paliativos para um(a) atleta lesionado(a) seguir atuando, quando ele(a) deveria se retirar da ativa, tratar a lesão por meses, e não simplesmente seguir convivendo com a dor atenuada, meses a fio, piorando a lesão no longo prazo.

No Judô, como em toda modalidade de combate, é comum que o atleta use medicação para induzir a diurese e até diarreia, antes da pesagem. O atleta pesa, digamos, 76kg… E perde quatro, seis, oito quilos de água e nutrientes antes da pesagem, para entrar na categoria inferior. Depois, corre para se hidratar até a luta. Chame isso do que quiser. Menos de “saudável”.

E, depois de uma vida de preparação e dos esforços focados no ciclo olímpico – quatro anos de muito esforço, muita dor, muitas restrições, derrotas, vitórias, viagens… – a atleta Portela chegou até o momento de ver a redenção de sua cruz pessoal como atleta de alta performance.

Chegou até o momento, mas, viu o momento lhe ser tirado das mãos por fatores que, elogiosamente, chamarei de “caprichos de interpretação”.

O choro de Portela não foi por perder aquela luta, garanto. Foi, sim, por ver o sonho de uma vida ser arrancado de suas mãos sem que ela tivesse merecido a punição que lhe foi aplicada. A punição de um ponto não atribuído. A punição de, depois de praticamente quinze minutos, ser desclassificada por “falta de combatividade”. Um absurdo, por qualquer ângulo, para qualquer um que assistiu a mesma luta que eu assisti.

Tamaizova não é culpada de nada, até que se prove o contrário. Como eu disse, ela também deve ter uma história de vida e de atletismo muito parecida, senão igual ao da nossa Portela. Mas, eu tenho convicção de que ela não mereceu a medalha que levou, mais tarde (o bronze). E não por ela, em si. Mas, porque não era ela que deveria ter passado de round. Bem… Se o mundo fosse justo…

Pior do que isso: toda vez que eu me lembrar de Tamaizova, toda vez que um vídeo da história olímpica de 2020/2021 for reprisado, nas semanas que antecedem a próxima olimpíada, eu serei lembrado do crime que Portela sofreu. Eu serei forçado a dizer “não, Tamaizova… Essa medalha não é sua. Não era no seu peito que ela deveria estar. Se deveria estar em algum lugar, era no peito de Portela, se é que ela não iria mais longe, depois de lhe vencer”…

Deve doer demais. Nunca fui atleta profissional. Mas eu já tive sonhos arrancados de mim por motivos e forças que eu não tinha como lutar contra, ou alterar. E sei como é um sentimento cruel que te persegue pelo tempo. Creio que você também já se sentiu assim, em algum ponto, ou agora mesmo. Creio que todos já se sentiram assim. Então, porque se solidarizar publicamente com Portela?

Porque Portela representa parte do espírito humano de superar desafios, superar a si mesmo(a), seguir, mesmo com dor. São valores caros, especialmente para os tempos que passamos. São valores que, não só, mas especialmente, o esporte consegue cristalizar e ensinar.

Recuso-me aos chavões. Bobagens como “fulano(a) é um herói!”… Pura bobagem. “Herói” é palavra que reservo a quem faz algo realmente heroico, especialmente quando a vida está em jogo, ou outra coisa que valha quase tanto quanto. Atletas raramente são heróis só por serem atletas. Raríssimas vezes a palavra “herói” pode ser usada para alguém que, por vontade própria, decidiu competir e ganhar a vida através das competições desportivas.

Mas, Portela merece minha simpatia, me compadeço e entendo seu luto e sua dor, porque Portela é um símbolo que me lembra das vezes em que sonhei, em que dediquei bom tempo da minha vida a um propósito, com um custo (financeiro, material, emocional, temporal…) que só eu conheço, e isso foi tirado de mim sem que eu pudesse enfrentar aquilo em pé de igualdade. E eu lembro do sabor terrível de “injustiça” na boca. E consigo imaginar o gosto amargo que Portela teve de sentir, ali.

E, no fim, essa me parece a maior importância dos jogos olímpicos no mundo contemporâneo: ao mesmo tempo que os atletas representam a elite do preparo humano, do aperfeiçoamento da técnica, da precisão que beira ao maquinal… Eles também nos lembram da nossa humanidade, da nossa falibilidade, dos nossos limites, e de que essa vida é dor, é superação, é choro… É tudo que o comercial ou o coach não nos conta… A vida é cíclica, como um ciclo olímpico. Tudo que começa, um dia acaba. Muitas e muitas vezes, sem direito a protestos de “justo” ou “injusto”, com toda a imprecisão que tais termos carregam, como já discutimos.

Com a idade que tem, Portela já é “velha”… Outra face muito cruel do esporte profissional. Além do que, as novas gerações já estão pedindo passagem e o esporte olímpico, como a vida, faz o novo substituir o velho com muita frequência… Mas, agora, torço MUITO para ver Portela em Paris 2024.

Não porque eu ache que com trinta e seis anos e tantos meses, em 2024, Portela estará mais pronta ou terá mais chances do que tinha nessa edição.

Mas, se Portela voltar à Paris, ela me lembrará de algo que as Olimpíadas e especialmente, o Judô, sempre tentam nos ensinar: a vida vai nos derrubar inúmeras vezes. A real questão é quantas vezes teremos forças para nos levantar do chão duro em que ela nos jogou. Inclusive, quanta força ainda temos, mesmo cientes de que ela sempre vence e sempre nos dá o último tombo.

Força, Portela! Por você. Por mim. Por todos que sabem o que é ter um sonho arrancado das mãos e ter que se levantar depois de um pesadelo que ocorre enquanto estamos de olhos abertos.

Força! Não só por você. Mas por todos nós que já caímos, ao menos uma vez, e seguimos levantando enquanto der.

A minha semana na Rio 2016 (Ou “Porque eu amo os Jogos Olímpicos”) – Parte 1

De 1992 para 2016, as Olimpíadas são o evento feito pelo homem, que mais mexe comigo. Aqui, eu conto o porquê.

Arena Olímpica na Rio 2016
A visão da Arena Olímpica do Rio, no Parque Olímpico da Rio 2016, em nossa despedida, na noite de Sábado, dia 13 de Agosto. Foto: Bruna Andako

Acabou. :-\

Bem, para mim, “o melhor” já tinha acabado no último dia 14, quando, com uma precoce – e, honestamente, inesperada – tristeza nostálgica, me despedi do Rio de Janeiro, deixando o Aeroporto Internacional Antônio Carlos Jobim (o “Galeão”) e, me dirigindo de volta à terra da garoa.
Dizer “adeus” aos Jogos olímpicos sempre me deixa um pouco chateado…

Os quase 9 dias que passei no Rio de Janeiro, em plena Olimpíada, foram uma das experiências mais marcantes da minha vida, em parte pelo meu forte carinho pelo Judô, mas, também, pela minha ligação com os Jogos olímpicos e a valorização que eu faço quanto ao evento.

Para provar que não é conversa de quem “de repente” virou o “fã número 1”, compartilho alguns fatos que justificam esse carinho.

Em rápido esforço, tento me lembrar da situação mais antiga da qual consigo recordar, na minha vida inteira. E lembro de 3 coisas:

  1. Ganhar uma estrela amarela que falava/cantava e piscava, dos meus tios maternos, em 1990.
  2. A chegada do meu irmão, em casa, em 1991.
  3. O acendimento da Pira Olímpica, pelo arqueiro para-olímpico (me recuso a escrever “paralímpico”), Antonio Rebollo, em Barcelona, 1992; o que vi pela televisão.

Juro por tudo que pode ser jurado que essas são as 3 primeiras coisas mais marcantes que me lembro.

É óbvio que, em 1992, com 6 anos, eu não sabia nem que o arqueiro era para-olímpico e, muito menos, que se chamava Antonio. Muito menos sabia que era polêmica a história sobre se a flecha acendeu mesmo a Pira, e sobre toda a maluquice de terem 4 arqueiros (selecionados entre 200) de prontidão, e de que o nome do arqueiro saiu no último minuto, e de que ele foi instruído a errar o tiro, por segurança da platéia na abertura (mas, que acertou as pessoas do lado de fora do Estádio, sem nenhum cuidado maior). Nada disso, realmente, me ocorria na época.

Ao som do movimento mais conhecido de “Carmina Burana”, (que não é uma Opera, mas um conjunto de 254 poemas dos séculos XI~XIII, o que eu também não tinha a menor idéia, em 1992) chamado “O Fortuna”,(um dos 24 poemas musicalizados pelo alemão Carl Orff, sendo a peça clássica mais conhecida da Terra)  que narra a sujeição de todos nós à Roda da Fortuna, que inflige ora dor, ora alegria no destino dos homens; aquela era a coisa mais grandiosa que eu já tinha visto. Tal abertura dos Jogos de 1992, devia ser “o maior espetáculo da Terra”, eu pensava… Dos jogos em si, confesso que lembro muito pouco. Mas a abertura ficou gravada para sempre.
Lembro-me também de perguntar para meu pai qual era a “mecânica” dos jogos (não usei essas palavras, certamente), e lembro de receber uma resposta simples, mas, bem válida: Os melhores do mundo em cada esporte, são chamados e, então, competem entre si para saberem quem é o melhor. Simples, um tanto quanto impreciso, mas marcante: Já eram os melhores. Restava saber qual era O melhor.

Em 94, o Brasil de Bebeto, Romário, Dunga e companhia foi tetracampeão do futebol mundial, e isso, para um garoto de 8 anos, nascido no país do futebol, tirou um pouco do meu foco nas Olimpíadas. A prova disso é que, em Atlanta, 1996, eu praticamente não acompanhei os jogos. Aposto que os próprios adultos – baseado no que ouço dos mais velhos de hoje – da época menosprezavam as Olimpíadas, tendo em vista nossa histórica má performance nos jogos, e o alívio imediato de dizer “Podem ficar com seus jogos. Somos os reis intocáveis do Futebol”. Diante disso, a história de 1996 é, pra mim, um simulacro: Eu sei da história de 1996, da abertura, dos resultados e etc., não porque vivi e tive aquilo marcado em mim, mas, porque assisti depois de adulto aos filmes oficiais do evento e etc.

Em 1998, o Brasil faria o papelão diante da França de Zidane, e machucaria um pouco do meu prazer de amar só e somente o futebol. Hoje, não posso não ser grato a Zidane, por isto. Triste seria minha limitação, até como ser humano, se só tivesse alegria no futebol, e não tivesse aberto meus olhos ao universo dos esportes que vão MUITO além do esporte bretão. No embalo que eu vinha, e tendo em vista minha ignorância à Atlanta-96, cercado pelo discurso dos mais velhos que em nada se alterava: “Nosso negócio é futebol. Deixa esse negócio de Medalhinha para os gringos.”, ou “Copa do mundo é MUITO melhor que Olimpiada”, o destino era a ignorância esportiva e o raso conhecimento de quem só assiste “se valer ouro”.

Sidney 2000

A derrota para Zidane me fez voltar a assistir, com mais seriedade, à Sidney 2000. Lembro da abertura, e lembro de várias competições.
Lembro de ouvir falar de “um tal” Tiago Camilo (sim, em 2000) que ganhara a Prata, no Judo. Carlos Honorato trouxe outra. Nessa época, o Judo não significava nada pra mim, mas eu já sabia, de tanto ouvir os comentaristas, que este era o “carro-chefe” do Brasil, em todas as edições dos Jogos, até então. Eu não poderia imaginar que eu ia me emocionar de conhecer um deles, 16 anos depois.
Os velejadores Robert Scheidt (prata) e Torben Grael (bronze), eram os queridinhos da mídia nacional, e estavam sempre aparecendo.
Na natação, o “monstro” Gustavo Borges era nosso sonho de Ouro, mas tivemos que nos contentar com o Bronze. O Xuxa (Fernando Scherer) estava presente também, e angariou outro bronze. A natação, ao lado do Judo, sempre foi a modalidade onde mais depositávamos esperança de medalha. Nessa edição, trouxe uma.
Assistir os jogos e competições de madrugada, em canal aberto, era um grande desafio. Até porque, eu acordava cedo para ir à aula no outro dia. Pelo menos, o fuso-horário salvou os jogos de terem de competir com o Brasileirão, ou a Novela. Até porque, se competissem, iam ser sempre os últimos no “pódio” das prioridades da grade.

Quando alguém reclamar da performance do Brasil em 2016, lembre esse alguém que em 2000, só tivemos 12 medalhas (6/6), e nenhuma era de Ouro. Terminamos em 52º lugar no ranking de medalhas. Muito pior que nosso definitivo 13º lugar de agora, com 7/6/6 medalhas.

Tantas coisas ocorreram em 2000, em especial, em prol das mulheres, como mostrou o filme oficial de Sidney, recentemente reprisado na ESPN; como de costume, antes da abertura de novas edições dos Jogos. Eu não tinha consciência da importância de Sidney para muitas delas. Pesquise e você também poderá se surpreender.

Em 2002, o Brasil, novamente, ganha a Copa, e eu volto a oscilar entre o que vivi em 2000, torcendo por dezenas de atletas, em diferentes modalidades, e o reacendimento da chama que dizia : “Brasil, o país do futebol”.

Atenas 2004

Mas, com 18 anos e bem mais consciente, não me deixei levar e assisti, tanto quanto pude (já que não tinha TV a cabo), a Atenas-2004. Emocionante retorno dos Jogos ao seu berço, uma abertura fantástica e rica em cultura (afinal, era da Grécia que estávamos falando!) e mesmo com toda a dificuldade de depender da rede Globo para assistir, tive a “sorte” de não ingressar na Fatec-SP de primeira, o que me permitiu ter mais tempo para ficar em casa e ver os jogos mais de perto.

Em 2004, arrasamos nossa marca anterior, terminando em 16º colocados, com 5/2/3 medalhas (ouro/prata/bronze). Até a Rio 2016, a nossa melhor atuação, sem dúvida.
Tivemos nosso Volleyball masculino brilhando com Nalbert, Giba, Dante, Mauricio, Sérginho e tantos outros, com o ouro no peito.
Tivemos Scheidt e Grael, agora com o ouro reluzente pendurado neles.
Tivemos Rodrigo Pessoa com aquele 100% inesperado ouro no Hipismo (Hipismo? No Brasil?).
Tivemos as meninas do futebol, com Marta em campo, chegando na final e ficando com a prata.
Tivemos Leandro Guilheiro e Flávio Canto, no Judo, com 2 bronzes.

Mas, acima de todos esses nomes, pódios e rankings, tivemos Vanderlei Cordeiro de Lima: Sem sombra de dúvidas, o brasileiro que melhor representou o Brasil para o mundo nas Olimpíadas de 2004. Liderando uma prova de maratona, e perto do fim que o coroaria com o ouro, Vanderlei foi atacado por um Cristão lunático Irlandês. Perdeu tempo, ritmo, força, mas, nunca desistiu.
E mesmo ficando com o bronze, quando deveria ser ouro, sorria como um menino feliz ao entrar no Estádio onde a prova se encerrava. Um exemplo que, na época, eu não conseguia entender (por que ele não esmurrou o ex-padre? Eu matava o cara de porrada se me levasse a chance clara de ouro, como levou), mas que tocou o mundo do desporto, e fez com que o COI o presenteasse com a medalha “Pierre de Coubertin” (o patrono da moderna Olimpíada). A maior honraria que um atleta olímpico pode receber. Muito maior do que um ouro e entregue, até hoje, a somente 18 pessoas… Eu só soube disso depois, e se ele tivesse agido como eu imaginava agir, jamais teria ganhado essa honra.

2004 foi o nosso melhor momento, e eu tive a sorte de ver, tanto quanto pude, essa festa mundial do esporte.

Em 2006, o Brasil do melhor futebol do mundo, voltaria a cair para a França, com uma Seleção que, no papel, deveria ser o estado da arte. Na prática, contudo… Deu no que deu.

À essa altura, eu estava mais e mais convencido de que o futebol recebia muito amor do brasileiro, por pouco “resultado” de performance (não títulos, necessariamente, mas qualidade da exibição). Para mim, no auge da polarização, “atleta de verdade” era Vanderlei, que treinava no chão de terra, e não com as chuteiras mais caras do mundo, como Ronaldo Fenômeno.
Claro que, hoje, diante do que eu sei, percebo o quão bobo era o meu comentário: Eram todos Atletas com A maiúsculo. Por suas biografias no esporte, seus caminhos, tropeços e recomeços. Cada um, no entanto, exposto à uma realidade bem diferente de incentivo – o que não: Não pode ser colocado como culpa do atleta, em si.

Em 2007, iniciei meu treinamento no Judo, graças ao convite do amigo, Fernando de Bem, e logo descobri que aquele era meu lugar nos esportes. Eu me sentia muito à vontade (o que não quer dizer que eu era bom. Apenas que amava aquilo). Assistir ao PAN de 2007 foi um “esquenta para o que estava por vir”. É claro que eu queria assistir, muito mais pelo Judo, mas o PAN tinha uma cara de “mini-olimpíada” e, num dado ponto, eu já estava torcendo por 5 ou 6 modalidades.

Beijing (Pequim) 2008

Chegou 2008 e Beijing (Pequim, se preferirem) também. Muitas pessoas assinavam TV à cabo, para ter mais filmes, mais canais com cultura útil (o que é discutível), e etc. Eu assinei só para poder ver as Olimpíadas. Não me envergonho. Aliás, no meu primeiro emprego com carteira assinada, eu fiz questão de pagar a cara TV a cabo brasileira, com aquele salário de 622 reais, e ainda me desdobrei para aprovarem minhas férias no mesmo mês dos Jogos. A meta era só uma: Assistir o máximo de eventos possíveis.

Foi a minha primeira Olimpíada de “gente grande”. Chega da palhaçada de ter que ver a luta do Judo no quadradinho menor da tela. Chega de perder o jogo de Vôlei no meio, só porque o técnico de futebol local estava dando entrevista. Agora, eu tinha quase um canal por modalidade, e todo o tempo do mundo. Eu estava muito feliz.

E que sorte! Foi a abertura mais sensacional, megalomaníaca, alucinógena, profunda (contar a história da China… Não faltou assunto) e cara (~R$300 mi), da história dos jogos.

Em 2008, a China foi um monstro na competição, engolindo todas as medalhas que apareciam. A performance chinesa atropelou EUA e Rússia, sempre tão tradicionais, sem muito apuro.

O Brasil teve 3/4/9 medalhas, ficando em 23º lugar.
Tivemos o Vôlei femino, Maurren Magi, e Cielo, trazendo a mais dourada medalha para casa.
Tivemos a prata na Vela, no Vôlei masculino…
Tivemos Katleyn Quadros, Guilheiro e, novamente, Camilo, com o Bronze no Judo…

Enfim, 2008 foi o ano em que, definitivamente, eu passei a amar mais a Olimpíada do que o futebol. E isso apenas se ratificou nos eventos seguintes.

Londres 2012

2008 foi um ano muito difícil para o mundo. A crise dos mercados devastou o velho continente e, claro, engolfou a Grã-Bretanha e, obviamente, a Inglaterra. Não tenho toda essa memória, então, talvez esteja falando bobagens, mas, não lembro de um caso de cidade-sede dos Jogos com tantos protestos contra sua realização.
O temor do londrino era que gastassem tanto dinheiro que a cidade – que é o coração econômico da terra do Chá das 17h – viesse ao colapso financeiro inexorável.
Surpreendentemente, e em total oposição – podemos dizer: em um irônico Yin e Yang à Beijing, a abertura de Londres foi totalmente cost-smart. Os valores gastos na abertura de Londres (cerca de R$120 milhões) foram muito enxutos para os padrões Olímpicos, mas a execução foi primorosa o bastante para que os expectadores não ficassem horrorizados ao comparar Beijing 2008 (que custou quase R$300 milhões) e Londres 2012. Palmas para os britânicos.

Mais uma vez, no meu segundo emprego com carteira assinada, eu “me virei nos 30” e fiz minhas férias casarem com os jogos. Eu tinha que estar totalmente disponível para um evento que só ocorre à cada 4 anos. Pecado era não ter tempo de assistir nada.

A transmissão de 2012 foi muito mais inteligente do que as anteriores, muito embora 2008 não tenha sido ruim. No entanto, a maestria com a qual Londres foi televisionada criou, em minha opinião, uma nova marca na barra de qualidade da cobertura televisiva e jornalística do evento mundial.

Em 2012, o Brasil terminou em 22º, com 3/5/9 medalhas.
Mesmo sendo “fresco” na memória da maior parte das pessoas, relembro que Sarah Menezes trouxe o Ouro inédito no Judo.
Arthur Zanetti detonou nas argolas e trouxe a medalha dourada, também.
O Volleyball feminino de Jacqueline, Thaísa, Dani Lins, Sheila, Fabi, e tantas outras; mais um ouro.
Ainda tivemos a surpresa de Thiago Pereira na prata, com a Natação.
Os times de Futebol e Volleyball masculino, mais uma vez, trazendo a prata pra casa.
E, talvez, a maior surpresa tenha sido Esquiva Falcão, com sua prata inesperada.
Kitadai, Mayra Aguiar e Rafael “Baby” Silva, o Bronze, no Judo.
Scheidt sempre medalhando, e Cielo, também trazendo o Bronze para o Brasil.
E como não falar de Yane Marques e a inesperada medalha de Bronze no Pentatlo (Pentatlo? 🙂 )?

Em resumo, Londres 2012 foi fantástica, não por ter melhorado nossa marca no ranking, ou superado a melhor marca que continuava sendo Atenas, em 2004. Mas, foi o melhor ciclo olímpico para apresentar diversidade de esportes com potencial, e que mereciam a atenção e o apoio dos brasileiros.

Nesse sentido, eu acredito que Londres ajudou a “evangelizar” nossa população sobre a beleza de se assistir à uma Olimpíada, como nenhuma outra edição conseguiu fazer.

(Terminei de redigir esse texto às 4h18 da manhã, e ainda pretendo reler e, talvez, precise editar algo. Peço desculpas de antemão, caso tenha algum erro grosseiro de português ou de argumentação, mas, prometo corrigir mais tarde. No entanto, eu queria muito lançá-lo hoje, no primeiro horário. Daí a pressa).

No próximo post, vou falar, exclusivamente, do que vi, ouvi, senti, vivi (vocês entenderam a idéia, né?) na Rio 2016, in loco, e pela TV.

Nota em 2019, agosto: Quando escrevi esse artigo, a ideia era mesmo que ele possuísse duas partes. A segunda era para falar sobre como as olímpiadas tinham a chance de mudar a interação entre o povo do Rio e sua cidade, as possibilidades para os jovens, especialmente aqueles que costumam não ter acesso à oportunidades, eo que restou das Olímpiadas no Rio pós-2016.

Para meu total pesar, e de qualquer um que sente carinho pelos jogos olímpicos, lamentavelmente, o que restou no Rio foram escombros, e a situação apenas decaiu até o mais baixo nível de Estado. Um estado quebrado pela corrupção, fálido e estupidamente violento. Diante disso, desisti de tentar ver “o lado bom” da história porque, sinceramente, não houve nenhum. Por este motivo, não haverá uma parte II. De todo modo, o texto segue aqui, inalterado, senão por uma tentativa de melhorar o português contra o qual eu sempre peco, aqui e ali.

Mas, por que – e, de novo – a França?

França: Território nas cores da bandeira e o símbolo de Luto por cima dele.
O território francês, nas cores da bandeira nacional, sob o símbolo do luto de uma nação que está, tristemente, se acostumando com o Terror. Fonte: Montagem própria com Wikipedia + Internet.

Começar o texto com uma pergunta que não pode ser respondida – ao menos, não com “‘A’ resposta certa” – não é a jogada mais inteligente…

Por outro lado, fazê-la, parece-me inevitável: Afinal: Mas por que, de novo, a França?

É preciso lembrar tudo o que já ocorreu – de ruim – no território onde os Gauleses viveram, e fazer menções à alguns aspectos que, talvez, e só talvez, possam explicar o porquê do Terror ter escolhido a França como seu novo alvo predileto.

O número de ataques à França não é pequeno. É o país desenvolvido, mais atacado pelo DAESH (ou ISIS, como preferir…), em todo o mundo ocidental, desde o começo da escalada do novo emissário do Terror.

O primeiro ataque da organização à França, ocorreu entre 7 e 9 de Janeiro de 2015, quando a sede parisiense da revista “Charlie Hebdo” foi alvo de 2 atiradores, os irmãos Kuachi, franco-argelinos, com pouco mais de 30 anos. Na mesma série, outro atirador na mesma faixa de idade, Amedy Coulibaly, tomou um comércio de donos Judeus. Ao todo, 17 pessoas foram mortas durante 3 dias em que a França ficou acuada e trancada, dentro de casa, enquanto as autoridades tentavam achar os terroristas.

Depois, em Fevereiro de 2015, um homem de 30 anos, esfaqueia 3 soldados que protegiam uma rádio Judaica em Nice. Sim, a mesma do lunático motorista do Caminhão da última quinta-feira.
Intrigantemente, o agressor tem o mesmo sobrenome do terceiro atirador da primeira onda de Terror. Não há divulgação concreta sob o parentesco dos 2 (mas, no caso da Charlie Hedbo, sabe-se que eram irmãos e nacionais descendentes de argelinos).
Sendo o primeiro terrorista capturado vivo (os 3 primeiros morreram), Moussa declara, em depoimento, “ódio à França, ao Militares, ao Governo, e aos Judeus e Infiéis”.

Após essas duas ocorrências, em Abril, outro Argelino, Sid Ahmed Ghlam, com visto de estudante, é detido em Paris, sobre suspeita de homicídio, e de estar preparando um atentado contra os trens da cidade, onde o objetivo seria “matar 150 infiéis, ou mais”. O alvo secundário era a Basílica Sacré-Coeur.

Mais tarde, em Junho de 2015, um homem é decapitado em Lyon, dentro de uma fábrica de combustíveis. O autor é o seu funcionário, Yassin Salhi, de 35 anos. Ele é nascido na França, com pai argelino e mãe marroquina. Depois da decapitação, envolto em bandeiras com símbolos do Islã, ele tenta explodir toda a planta, mas, sem sucesso. Foi capturado pelas forças policiais.

O ponto mais assustador é atingido em Novembro de 2015, quando Paris sofre uma série de ataques coordenados, com o pior ocorrendo na casa de Shows “Bataclan”. 130 pessoas foram mortas, e 350 ficaram feridas.
Salah Abdeslam, o único envolvido com o atentado a sobreviver nas buscas e confrontos policiais, se nega a comentar qualquer questão relacionada ao caso, após ter sido extraditado para a França, tendo sido capturado depois de uma longa operação no território belga. Com 26 anos, e de origem Belga, é o terrorista mais novo da lista, até agora. Com pais de origem Argelina, ele engrossa a lista de ligações com aquele país, e os atentados na França.

No mais recente episódio de Terror na Gália, o motorista Mohamed Bouhlel, tunisiano de 31 anos, atropelou e matou 84 pessoas (mais dezenas de feridos, em estado crítico), ao longo de 2 quilômetros, percorridos com um caminhão-baú, na Promenade des Anglais (Passeio dos Ingleses), onde a cidade de Nice comemorava a data histórica da Queda da Bastilha (14 de Julho) que é fundamental na história da Revolução Francesa.
O DAESH assumiu a autoria do ataque, mas, tudo ainda soa incerto. As fontes, versões e fatos vão se desdobrando, e os órgãos de inteligência ainda não sabem com quem Mohamed se relacionava, seus contatos no celular e no computador, e detalhes que ajudem a compreender a dimensão de seu ato.
Por ora, apenas um casal de Albaneses que ajudaram Mohamed com acesso à armamento, foram detidos, por SMS com conteúdo incriminador, trocado entre o marido e o Mohamed.
Entre a chance de blefe do DAESH, as alegações de algumas fontes de que trata-se de um ato de um desequilibrado mental que foi indevidamente capitalizado pelo grupo terrorista, nenhuma hipótese pode ser totalmente descartada, ainda.

Não vamos falar sobre os ataques em Orlando, San Bernardino, e Boston (EUA), Bélgica, Iraque e Turquia, pois, falar da França já rende assunto o bastante. No entanto, parece evidente a escalada da violência do grupo terrorista e, não somente, algo pontual e localizado.

Alguns analistas apontam que, embora o DAESH mire em todo o ocidente, a França, por ser simbolo das Revoluções que pavimentaram o Iluminismo, a forte crença de seu povo em valores como Democracia, República, e Laicismo, é um contraponto absoluto à tudo que o DAESH prega e deve ser destruída, como prova maior da determinação dos terroristas.
De maneira mais objetiva (ou menos simbólica), podemos citar o tratado de 1916, Sykes-Picot, assinado entre França e Reino Unido, que acabou com o império Otomano, criando fronteiras artificiais (de onde surgiram, por exemplo, Síria e Iraque), destruindo a base do sonho de muitos radicais, sobre um Califado que dominasse todo o Oriente Médio, por vezes, referido como Oumma (Comunidade de crentes).
Todos esses motivos podem ser a real causa do porquê Abu Mohamed Al-Adnani, porta-voz oficial do DAESH, disse, em 2014, “Mate com pedras, facas, ou seu carro (…) em especial, os sujos e desprezíveis franceses”.

Jovens, homens, 30 anos, nacionais, com descendência islâmica.

Não se trata de profiling (preconceito), mas, como eu identifiquei, ao longo da história recente dos ataques à França, existe sim, um padrão de “recrutamento”.

A esmagadora maioria dos agressores tem a origem na Argélia.

A Argélia é um país entre o Norte da África e o Saara, e já foi colônia francesa. A colonização não foi nada pacífica (a França invade a Argélia em 1830, mas só toma o território, por completo, no meio do século XX), e, para não chegar às 8000 palavras, eu vou resumir dizendo que houve um “mini-apartheid” aos moldes dos colonizadores holandeses, na África do Sul.

Só ao fim de vários conflitos é que a França estendeu direitos de cidadania aos Argelinos muçulmanos (por anos, eles não eram considerados cidadãos, e os índices de analfabetismo – por exemplo – eram agressivos para essa parte da sociedade).

A independência Argelina só ocorre no fim do século XX, e é pavimentada através de muito terrorismo. A guerra civil é uma realidade entre tropas francesas, a FLN (Frente de Libertação Nacional), e a  OAS (Organização do Exército Secreto).

A FLN representa parte da sociedade reprimida pelas décadas de opressão dos colonizadores, e o OAS é um braço radical do Exército Argelino, guiado por um general Islâmico, sendo que o terrorismo é a arma de ambos. Depois, OAS e FLN se enfrentam, com mais terrorismo.

Em 1962, Charles de Gaulle, presidente francês, se vê forçado a assinar armísticio com essas organizações, onde reconhece a independência da Argélia, e garantia de direitos aos franceses, ainda residentes na Argélia.

Ao fim do processo, apenas 1% de Cristãos restam no território e, o novo governo, formado pela FLN, edita decreto que restringe o culto ao Cristianismo, e a perseguição aos Cristãos começa. Terrorismo, como se percebe, é o triste meio pelo qual a Argélia é constituída, ao longo de sua história recente.

E a França está no epicentro disso tudo, por todos os seus atos e medidas com sua ex-colônia.

Mais que isso, o processo, em larga escala, contínuo, de imigração da região do Maghreb (o noroeste do continente Africano) para a França, e a criação de “ghettos” ao redor de Paris, onde essa população é “estocada” – na falta de palavra melhor – só aprofunda a gigantesca cisão com o sentimento de pertencimento desses indivíduos, dentro do território francês. Antes de supor a culpa dessas pessoas, é bom lembrar que a França bancou e patrocinou essa imigração, para fins de reconstruir a nação no pós-guerra, onde o país encontrava-se devastado pela ocupação alemã, e demais desdobramentos históricos.

A França é mais vulnerável ao terrorismo?

Difícil de responder (comparado à quem?), embora tudo indique que não.

A França é a quinta maior economia do mundo (PIB nominal), sendo a segunda maior, dentro da Europa.

A França também tem o terceiro maior orçamento militar do mundo. Mas, em contrapartida (para compreender o risco à que está exposta), também é o país mais visitado por turistas, no mundo todo. Por ano, são 82 milhões deles. Para ter uma idéia do que isso representa, a população regular da França é da ordem de ~65 milhões. Significa que, praticamente, “outra França + 1/3” entra e sai das fronteiras do país, todos os anos.

Como líder mundial, a França pode se orgulhar de ser uma das nações fundadoras da União Europeia, além de possuir a maior área e a segunda maior economia do bloco. Também ajudou a fundar a Organização das Nações Unidas, além de pertencer ao G8, ao G20, à OTAN, à OCDE, e à OMC.

Acredito que, diante do exposto, fica difícil supor que a França não invista valor considerável na manutenção de sua Segurança Nacional, ou que seja imatura em lidar com imigração, controle de fronteiras, e etc. Ela investe muito (o 2º maior investimento), e ela lida com um volume de estrangeiros, sem igual (sua própria população + 1/3).

Mas… O terrorismo nas fronteiras francesas, não é aquele “terrorismo regular”, hollywoodiano, que tanto nos acostumamos a imaginar com os filmes da década de 80 e 90.

Como o perfil dos agressores bem demonstra, a gritante maioria é de franceses (e não de estrangeiros, viajando com a missão de perpetrar os ataques, furando barreiras e controles de imigração…), descendentes de pais com outra nacionalidade (em especial, argelinos). Portanto, a guerra travada contra o terrorismo, não consegue gerar um “escudo protetor” no país, porque seus inimigos nasceram e estão lá dentro, desde sempre. Não há barreira ou proteção a ser superada.

Na minha opinião, a recente política externa da França, com fulcro na relação às suas colônias, começa a cobrar um alto preço. Especialmente, a forma como esses imigrantes foram tratados – renegados aos ghettos parisienses – parece gerar a condição perfeita de mágoa, não-pertencimento, frustração, segregação, e ausência de identificação com os valores nacionais, tornando esses indivíduos, alvos perfeitos para o recrutamento da organização terrorista, o DAESH.

O que pode ser feito?

Cansativo fazer um texto para o qual as respostas são vagas, ou imprecisas, e onde não há consenso.

O que a grande maioria dos cientistas políticos e professores de Lei vão dizer (não sem oposição respeitável e considerável) é o seguinte:

  1. A guerra ao DAESH precisa ser feita e levada, em seus territórios de domínio. Se colocar homens em solo, talvez (e só talvez, já que pode não haver real alternativa), venha a ser má idéia (como outras forças de ocupação já demonstraram ser, antes), continuar lançando bombas teleguiadas, não fará nenhum efeito na força do grupo terrorista. Não funcionou, até agora.
    A guerra precisará ocorrer porque, atualmente, o poder físico e territorial do DAESH mantém o grupo armado, alimentado, organizado, com moral e poderoso. A idéia de que o DAESH estava acabado, com os recuos no território Iraquiano, foi enganosa e descolada da realidade. Na verdade, a aceleração dos eventos de Terror, e o número de ataques, sugerem exatamente o contrário: O DAESH tem ficado cada vez mais poderoso e tem células em diversos países. Estima-se que, atualmente, o DAESH está atuando em 50 países, seja por meio de territórios dominados, ou países alvos de ataques.
  2. A guerra ao DAESH não se resume à ação militar. O DAESH criou um novo tipo de Terror, onde o agressor não atravessa fronteiras, mas, para desespero das autoridades, nasce e vive, desde o princípio, no seu alvo. Essa capacidade mobilizante, e de propaganda que atinge, principalmente, homens jovens, por volta dos 30 anos, residentes nos países-alvo, e com descendência de famílias de fé Islâmica, precisa ser estancada e combatida. O discurso e a retórica do DAESH precisa deixar de ser tão contundente nos corações e mentes dessas populações. E se é tão efetivo, é sinal de que essas populações estão desassistidas e isoladas da sociedade desses países; motivo pelo qual à mensagem é tão efetiva.

De um ponto de vista histórico, o radicalismo islâmico tem sido sustentado, muito por conta do abismo no desenvolvimento social desses povos. A miséria do indivíduo é justificada como fruto do seu distanciamento da lei de Allah.
A distorção do Corão – não obstante o fato que seu texto seja, por vezes, patrocinador da guerra abençoada (embora, ela possa ser interpretada, de forma light, como uma “guerra” só no campo da fé e das idéias) – para justificar a Jihad, tem o poder de arrebatar aqueles que estão completamente descrentes de uma chance de vida digna.
Vale dizer, também, que tal radicalismo não é exclusivo do Corão. A Bíblia do Cristianismo, em seu Velho Testamento, justifica atrocidades não muito distantes do que pregam os radicais do Islã.

A diferença é que o ocidente continuou seguindo em frente, e chegou no século XXI (com seus defeitos e qualidades, cabe enfatizar).
As sociedades do Oriente Médio, no entanto, parecem ter parado no século XI, e ainda vivem os dilemas e valores das épocas das Cruzadas européias: Sociedades com castas claras e intransponíveis, hierarquias familiares, e dogmas inquestionáveis, a submissão da mulher ao status de objeto e propriedade e, por fim; o triste conceito de que, em nome da fé, não há limite, nem ato que possa ser execrado, diante da aprovação de uma deidade – que, curiosamente, só pode ser ouvida por alguns indivíduos que nunca se matam, mas mandam outros para a morte.

Como fica a Rio 2016?

Quantas vezes já citei esse evento? Bem, pode parecer sensacionalismo, mas, não é brilhante, nem exige uma mente maligna e genial, perceber que o evento que concatena dezenas de países, será um alvo muito tentador ao DAESH e outras organizações que propagam sua ideologia pelo Terror (exempli gratia: Al-Qaeda).

Para se ter uma idéia, vamos à breve análise:

A Copa de 2014, no Brasil, teve ~350 mil pedidos de credenciamento, entre autoridades, delegações, jornalistas, profissionais envolvidos com os jogos, e etc.

A Olimpíada de Londres, em 2012, teve ~420 mil.

A Olimpíada do Rio, já tem 460 mil pedidos de credenciamento. Destes, 11 mil foram indeferidos.
E já sabemos: Nesse mar de gente, 4 deles estão, comprovadamente, envolvidos com o terrorismo internacional.

Não quer dizer que um ataque ao Rio é inevitável. Mas, quer, sim, dizer que o alvo interessa.

Vai viajar de avião, dentro do Brasil? Chegue bem mais cedo…

Pessoal, esse é um post “utilidade pública”.

Está em vigor, desde já, o novo procedimento de inspeção da ANAC (Agência Nacional da Aviação Civil).

O que isso significa?

Bem, eu sempre me programava para chegar 1h, antes do meu vôo doméstico. Isso não vai funcionar mais.

Eu gastei 30 minutos a mais, só para passar pela inspeção (raio-x, revista e verificação), em um vôo e horário vazio, com baixo volume de passageiros no aeroporto.

Em horários de pico, os passageiros estão levando até 2h só para passar da entrada do aeroporto, até os gates de onde partem os vôos.

O novo procedimento inclui o tradicional raio-x da bagagem de mão, revista corporal “frente e verso”, inspeção minuciosa de todos os compartimentos das malas e mochilas levadas à bordo (eles estão abrindo todas, sem amostragem), e separação do notebook, da bagagem principal.

A operação será mantida ao longo de toda a duração dos Jogos Olímpicos e Para-Olímpicos do Rio de Janeiro.
O motivo do novo procedimento é o alto nível de ameaça terrorista ao país, por conta dos jogos.

Mais informações: http://www.anac.gov.br/noticias/procedimentos-de-inspecao-no-transporte-aereo

O Brasil e a Segurança: A barbárie será, um dia, só um capítulo de nossa História?

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Foto de Andréa Farias / Agência O Dia / Rio de Janeiro

Bar·bá·ri·e
sf
1 Multidão de bárbaros.
2 Ação própria de bárbaros; atrocidade, barbarismo, crueldade..
3 Hábito de bárbaros.
4 Falta de civilização; atraso, barbarismo, grosseria, selvageria.

– Michaelis Online

Bem, não é preciso ser genial para perceber: O Brasil é um lugar muito inseguro.

“Uau! Parem as prensas! Já foi muita revelação para o meu fraco coração…”. ¬¬

Bem, eu acho que preciso ser mais enfático, mesmo: O Brasil é um lugar muito inseguro, comparado à países em guerra… Acho que melhorou, (a compreensão da desgraça) né?

Segundo o Atlas (também conhecido como “Mapa”) da Violência de 2016 (curiosamente, você não vai achar o estudo no site do IPEA [o link está “quebrado”, às vésperas das Olimpíadas, mas, isso pode ser só mais uma teoria conspiratória infundada, da minha parte], contudo, ele foi encontrado aqui:
http://infogbucket.s3.amazonaws.com/arquivos/2016/03/22/atlas_da_violencia_2016.pdf), o Brasil perde 59 mil e 500 indivíduos para a violência, todos os anos, com base no ano de 2014. Não há – ainda – consolidação dos dados para 2015 e 2016, o que é esperado para um estudo de consolidação estatística, feito por um órgão público.

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Fonte: IBGE/Diretoria de Pesquisas. Coordenação de População e Indicadores Sociais. Gerência de Estudos e Análises da Dinâmica Demográfica e MS/SVS/CGIAE – Sistema de Informações sobre Mortalidade – SIM

Em termos de taxa média, são 29,1 mortos para cada grupo de 100 mil habitantes, e isso é relativamente importante para não tornar o número, puro golpe midiático.

Explico-me: Se você mora em um país com 324 milhões de compatriotas (demografia dos EUA), a morte de 2.6 milhões de indivíduos por ano é absolutamente regular (dados, também, de 2014). Se seu país tem menos de 2 milhões de habitantes (como na Irlanda do Norte), por outro lado, 500 mil mortos anuais são 25% de toda a população – e seu país vai falir, ou ficar vazio (não necessariamente nessa ordem), em pouco tempo.
A taxa média nos ajuda a comparar laranjas com laranjas, e bananas com bananas, portanto.

Então, para te fazer perceber a estupidez do nosso número, aqui vai um TOP-5 macabro: Países com conflitos deflagrados (em guerra), os mortos em 2015, e a taxa para cada 100 mil habitantes.

País – População – Mortos em 2015 – Mortos/100 mil habitantes

Síria (Guerra civil[2011] + DAESH [ou “ISIS”]) – 17 milhões – 55.219 – 323,58

Afeganistão (desde 1978, em guerra) – 35.6 milhões – 36.345 –  102,09

Iraque (desde 2003) – 37.1 milhões –  21.433 – 57,77

Somália (em guerra civil, enfrentando insurgentes e engolfando até o Quênia, desde 1991) –  55.9 milhões* – 4.365 –  7,81
*Somália e Quênia somados, já que os mortos estão em todos os lados.

África (continente enfrenta o Boko Haram desde 2009) – 235.6* – 11.651 – 4.95
*Nigéria + Camarões + Níger + Chade somados: Todos sob ataque dos insurgentes.

Então, comparando a taxa nacional de mortes violentas para cada 100 mil habitantes, compensa continuar enfrentando o Boko Haram, ou morrendo de fome e na facada na calamitosa Somália. Você está mais seguro lá, do que aqui.

Em números absolutos, isso fica ainda pior. Nós matamos, violentamente, 59.5 mil brasileiros/ano. Isso é 7.7% acima do país com a guerra mais violenta no momento; a Síria. Portanto, matamos uma Síria por ano, mais 8% arredondados. Compensa, pelos 8% a menos de risco, ficar por lá.

E só ficamos “bem na foto” (se é que se pode dizer isto), pela média nacional… Se olharmos a taxa de mortos/100 mil habitantes nordestina, compensa (no, primeiro caso, por MUITO) ficar até mesmo no Iraque:

Alagoas: 63/100 mil;

Ceará: 52,2/100 mil;

Sergipe: 49.4/100 mil.

“Legal, estou convencido: Somos um país muito violento. Mas, o que tem de novo?”

Esse é, sem sombra de dúvidas, o maior problema: Não há nada de novo.

Sequer nos chocamos. Sequer nos apavoramos. Somos, enquanto sociedade, cidadãos, pais, irmãos, amigos, colegas; entorpecidos, anestesiados para “a Síria que morre” violentamente por ano, em nossa pátria. Melhor não citar “a outra Síria”, morta no trânsito brasileiro, anualmente, também.

A guerra do Vietnã durou 12 anos para os EUA (que entrou em 1963), e matou pouco mais de 58 mil norte-americanos. E o choque social dessas 58 mil mortes, ao longo de mais de uma década, pode ser sentido em movimentos sociais e frentes nacionais contemporâneos, ferrenhos em criticar a política externa norte-americana atual; horror e revolta provocada e mantida pela morte de militares, ao longo de uma Guerra de 12 anos e que já completou 36 anos de fracasso.

12 anos de combate. 58 mil militares mortos.

Matamos mais que isso por ano (crianças, mulheres, jovens e, não só militares [não que a vida de alguém valha menos, em função de sua profissão, claro]), sem remorso, sem susto, sem piedade, sem horror; conformados, calados, resolutos, resignados, apáticos… Nada mais nos comove, enquanto nação, enquanto sociedade civil; sociedade civil que é parte tanto da solução, quanto do problema.
Matamos sistematicamente, no que parece um macabro compromisso com a sustentação desses números, ano após ano, como se fosse um record a ser mantido e superado. Nosso maior desafio anual. Sabe como é: Com a gente, o negócio é deixar a meta aberta e dobrar!

Mas, “tristemente”, temos um desafiante nos destronando, e é hora de matar mais, porque o brasileiro não desiste nunca!

No momento, lamentavelmente, a coroa é da Venezuela com 90 mortos por 100 mil habitantes/ano. Oficialmente, o país que não está – declaradamente, ao menos – em guerra, mais violento do mundo.

Um tema pra lá de comum, quando esses números aparecem é:

“Ah, mas, no Brasil, a polícia mata demais! Quem mais morre são os negros, os pobres, os desassistidos e marginalizados!”.

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Foto: André Gustavo Stumpf – PM-DF

O mote, acima, tem uma porção de informações comprováveis, e outra porção de mitos, desinformação, e intenções questionáveis. Já adianto…

Verdade é que de 2013 para 2014, a letalidade policial subiu 37,2%.
Estima-se que ~3 mil pessoas foram mortas pelas forças policiais em 2014. Isso representa, no entanto 5% do total de mortes registradas no período. Embora pudesse ser perto de 0% e, embora possamos aceitar uma conspiração no sentido de que esse número está sub-notificado (aceitemos 10%, então, para a alegria dos opositores ao trabalho policial brasileiro; não obstante os dados de SP, RJ, sejam considerados realistas até por entidades ligadas à bandeiras típicas dos Direitos Humanos), ainda há que se falar em 90% dos 53 mil mortos, que não vêm da prática ruim do policiamento.

Mais: Para cada 4 pessoas mortas em confrontos com a Polícia, um policial morreu. A população do Estado de São Paulo? 43 milhões (segundo o SEADE). E a população da Polícia Paulista (PM, Civil, Cientifica)? 138 mil. Faça as contas da taxa por 100 mil, você mesmo, e diga-me quem deveria estar mais aterrorizado.

Também é verdade que jovens negros têm muito mais chances de morrer do que jovens de outras etnias (147% a mais, segundo o Atlas/2014). Mesmo considerando que mais da metade da nossa população é de negros e pardos (51%, segundo o Censo 2010), 147% a mais de chances, não é um número relativizável.

No entanto, o que se ignora é que educação é um fator preponderante de exposição à morte pelo crime. Grupos de jovens de 21 anos, de qualquer etnia e cor de pele, com menos de 7 anos de estudo formal, têm 16,9 vezes mais chances de morrer violentamente, do que aqueles que estudaram. Não é muito difícil supor, então,  que há uma grande abstenção escolar (maior do que nas demais etnias), entre os grupos de etnias afro-descendentes.

E, oras: Se mais da metade da nossa população é de negros e pardos, e se a Polícia “só” tem autoria em 5% (convencionamos 10%, para agradar os que acham o número sub-notificado), então é bastante provável que negros e pardos estejam matando negros e pardos, ou, o número de Carecas do ABC seja estrondosamente maior do que apontam as autoridades.
Brincadeiras (de mal gosto, eu sei; como os números que ignoramos) à parte, a guerra entre gangues rivais não é ficção. É a realidade periférica da nação.

Pedro Paulo Soares Pereira, “vulgo” Mano Brown, vocalista dos Racionais MC’s, em uma entrevista ao “Roda Viva” da TV Cultura, em 2007, declarou que para ele, o Brasil convive com 3 grandes enfrentamentos:

  1. Os ricos contra os pobres.
  2. Os negros contra os negros.
  3. Os brancos contra os negros.

Não obstante a minha discordância com os critérios dele para montar a lista, não posso negar que ele está muito mais envolvido com a conscientização do combate à violência, ao menos na periferia de São Paulo, do que eu estou. Deve, portanto, ter algum pesar em assumir essa consideração, tão triste para um líder (oficialmente ou não) do movimento de Consciência Negra.

Vou propor um rápido exercício: Só 5% dos 59 mil brasileiros morrem em confronto policial, então, pelo menos outros 50% têm que, seguindo a lógica, ser fruto do confronto entre os próprios criminosos. E outros 45%, imagino, entre criminosos e população. Não há, no estudo, números separados por “criminosos mortos” e “pais de família mortos”.
Toda essa divisão (exceto pelos 5% mortos pelas forças policiais), é arbitrária, claro.

Logo, tirando o que é morte por confronto com a polícia, não temos como saber quem morre mais:  Cidadão por bandido, ou bandido por bandido.
Então, antes de mais nada, longe de ser “bonzinho e amável”, o brasileiro é um indivíduo violento, só pela simples reflexão dos números expostos, até o momento, e sem falar da violência estatal.

Para dar “mais alento” à todos nós, fica o “calmante” de que para toda a criminalidade registrada nas delegacias, não são apurados mais do que 8% dos crimes.
Desses 8%, 2% são homicídios.

Eu vou diminuir – só um pouco – nossa vergonha, e não vou contabilizar o fato que juntando a estatística de mortos pela violência, e do mortos no transito brasileiro, matamos 2 guerras da Síria/ano.
Em resumo, sem falar de doenças, velhice, acidentes domésticos (todos estes, grandes ofensores da mortalidade nacional), só o crime e o trânsito superam os 100 mil mortos por ano, com facilidade e margem folgada.

A Segurança Pública como um “braço” da Segurança Nacional.

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Foto: Wikipedia.org – Forças Especiais em revista, no 7 de Setembro.

O capítulo “Segurança Nacional”, no Brasil, é bem complicado, controverso e feito de avanços e atrasos mensuráveis em décadas, em atos sub-sequentes.

Por “Segurança Nacional” quero significar aquela que se faz para proteger a Nação de agressores externos e internos, quanto aos interesses do Estado que, por sua vez, representa a sociedade que o empodera, e os interesses desta última, deve defender.

“Segurança Nacional” ≠ “Segurança Pública”

A Segurança Pública, de acordo com a nossa Constituição (art. 144), é assunto destinado aos estados. Daqui, já desdobra-se um dos efeitos dos anos de Ditadura: A desconfiança dos estados, em relação a uma Federação (União) intervencionista, levou os constituintes a garantirem a autonomia estadual quanto ao assunto, no Pacto Federativo.

Portanto, a organização, investimento, e políticas públicas que pautam as polícias civis, militares e órgãos correlatos, é do Chefe do Executivo Estadual (Governador[a]). Já a Polícia Federal é de responsabilidade do Chefe do Executivo Federal (Presidente).

Assim, temos essas situações bizarras de um Estado informatizando suas delegacias e interligando sua polícias com GPS, sistemas de câmera e OCR de placas de carro e etc. (SP), e um Estado onde as novas turmas de Policiais Militares são dispensadas ao meio-dia, todos os dias, por falta de dinheiro para pagar o almoço dos alunos (RJ). No entanto, mesmo sem a carga horária esperada, pode apostar que estes últimos estarão nas ruas, sem nenhuma reposição da carga perdida.
É claro que, sob a lupa, nem SP, nem RJ, têm seriedade no investimento (não só de verba, mas de qualidade e planejamento) que fazem para a Segurança Pública. Mas, essa “liberdade administrativa” total, gerou um desequilíbrio difícil de transpor, aprofundado por anos, e que gera aquele triste mapa do começo desse artigo.

A Segurança Nacional, no entanto, é uma política muito mais abrangente, e essencialmente, mais militarizada.
Segurança Nacional que, aliás, inexiste em nossa lei Federal, e muito menos na Constituição.
Não vou contar a longa história (acreditem, é bem mais longa do que vou expor). Vamos ficar com a curta:

A idéia de “Segurança Nacional” aparece, no Brasil, no pós Segunda Guerra Mundial. Especialmente, os militares de carreira com grau de oficialato, foram mandados para os Estados Unidos da América que treinou e ensinou o conceito norte-americano nesse assunto.
É bom contextualizar que o pós WW-II, é o começo das tensões entre URSS e EUA, e isso leva às páginas da bem conhecida Guerra Fria. Assim, os EUA, abertamente, ajudaram países a “resistir” ao avanço comunista, e esse programa de treinamento de militares era uma das faces desse portfólio.

Dessa leva de militares de carreira, formados nos moldes das escolas dos EUA, nasce a ESG (Escola Superior de Guerra), instituída pela lei 785/49, e diretamente ligada ao Ministério da Defesa.
Não respondendo á nenhuma das 3 forças armadas, mas, formada por todas elas, a ESG tem a missão atual de prover Altos Estudos de Política, Estratégia e Defesa, sendo um órgão de puro desenvolvimento Acadêmico (inclusive para civis), e não tendo desenvolvimento de táticas e exercícios militares práticos em seu currículo. Puras estratégia, política, diplomacia, e inteligência compõem a grade dos cursos.

A ESG tem uma história muito polêmica, pois, era considerada uma Escola de formação do pensamento conservador de Direita. É dessa escola que surge o embasamento para o Ato Institucional nº 1 que, entre várias medidas arbitrárias, tem a agressiva medida de mudar a eleição presidencial para o modelo indireto, colegiado (embora as pessoas apenas se lembrem do nome “AI-5” [que não é uma divisão ou um grupamento, mas, uma lei], é o AI-1 que inicia, legalmente, a ditadura no Brasil).

Mas, é também essa linha de pensamento que fundamenta a ESG, que fundamentaria o capítulo de Segurança Nacional da Constituição de 1946, e mais tarde, a própria ESG aumenta o entendimento de “Segurança Nacional” na CF/1967 (inclusive, com pena de morte para os crimes contra ela),  e que estabelece os padrões de atuação, engajamento, e estruturação da proteção Nacional, bem como dos órgãos de inteligência, como o finado SNI (Sistema Nacional de Inteligência), sendo um órgão que, a despeito do seu triste emprego ditatorial, era muito avançado e organizado.

Com a redemocratização brasileira e, tendo em vista a grande fobia militar dos constituintes de 88 (que excluíram o capítulo de Segurança Nacional, e substituíram pelo atual capítulo III, “Segurança Pública”), culminando com a ascensão de Collor, em 1990, o presidente (que viria a ser impedido) decreta o fim do SNI. O fim do órgão não é só um momento de vácuo administrativo e executivo, mas, gera tal desordem na Inteligência brasileira que os operadores do Sistema deflagraram uma crise (que ficou conhecido como Escândalo dos Arapongas, na década de 90) onde espionavam candidatos e oposição, a serviço dos poderosos de Brasília.

Atualmente, o termo “Segurança Nacional” aparece apenas uma vez na CF/88, e sequer dá-se o tom do que ele significa para nossa Nação e para a própria lei. É mera citação, vazia e sem contexto.

Como não temos Segurança Nacional – nem o conceito, nem a lei, nem “nada” – as idéias são difusas, espalhadas, pontuais. Não há um grande plano, esquematizado, construído ao longo dos governos, e incrementado conforme a evolução do cenário global, das ameaças regionais, e dos objetivos do Estado Brasileiro. O que interessa é o agora. O que interessa é a Urna, no próximo turno.
E que Deus salve essa terra, de seus inimigos e vilanescamente interessados. Porque nós, povo, não temos nenhum compromisso respeitável com esse capítulo.

Para não passar total vergonha, podemos citar o SISFRON, projeto elogiado e estudado em países como os EUA, patrocinado e mantido pelo Ministério da Defesa Brasileiro, e que junta um tripé de vigilância, inteligência, captação e triagem de dados e informações, mais o emprego de grupamentos e equipes especializadas, nas áreas de fronteira mais perigosas do Brasil.
Atual e lamentavelmente, o programa só existe na fronteira com a Bolívia e Colômbia. Devido ao forte “tremor” político, o programa perdeu espaço, pauta, destaque, investimento e orçamento.
Seu futuro é, agora, incerto. Mesmo sendo internacionalmente elogiado, o programa que seria um grande aprendizado à Segurança Nacional, não tem prestígio em uma Nação onde população e políticos, só sabem discutir segurança de uma maneira remediativa, pontual, midiática e sensacionalista.

A ABIN (Agência Brasileira de Inteligência) que foi recentemente instituída no ano de 1999, por FHC, tem seus acertos e melhorias, mas, não é preciso ser genial para saber que inteligência – do ponto de vista militar – é algo mantido com dinheiro. Inteligência não dá votos, em um país que não tem nenhum interesse no assunto.

Afinal, como todos sabem– e se não sabem, não deviam falar com a propriedade que demandam, sobre o assunto – o crime organizado brasileiro é totalmente baseado no tráfico de drogas e armas.
O “senhor do crime e seus asseclas”, nos morros desse Brasil à fora, não mantém seu controle com pistolas .380 (as únicas à disposição da população para auto-defesa, de forma legal) mas, com armas que, por vezes, sequer o Exército brasileiro possui.
A porosidade da nossa fronteira é conhecida para qualquer um que acompanha as apreensões de drogas e contrabando em geral. São dezenas de toneladas anuais.
A droga é a mercadoria do Morro. E a droga é a moeda que faz o caixa, o capital do crime. E a droga não é feita aqui (via de regra).

Então, quando pensamos em Segurança Pública de qualidade, ela é, na verdade, uma necessária decorrência de uma política séria, embasada, e de longo prazo, sobre o assunto “Segurança Nacional”. Sufocamos o contrabando internacional, e as drogas param de abastecer os morros, e as armas de longo alcance ficam sem munição e reposição.

Já vimos que, como programa, projeto de Estado (e não de governos que se sobrepõem e se recusam a continuar as idéias boas dos antecessores) a Segurança Pública é minada pela “liberdade administrativa”, como me referi, anteriormente.

E agora, com a completa ausência de um plano previsto, elaborado e amparado em lei, para falar em Segurança Nacional e começar a combater a origem do dinheiro do crime (as drogas que entram por todas as fronteiras nacionais), e a força que este emprega em sua manutenção territorial (as armas de grosso calibre e letalidade de “nível militar”, também, “imigrantes” em abundância, via fronteiras), fica bastante claro que a solução para a violência, no Brasil, está muito, muito distante.

O Brasil, diante das Olimpíadas, e a missão aterradora de fazer um evento pacifico, diante das ameaças do DAESH, e de uma ameaça bem mais presente: O crime do Rio.

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Colagens do DAESH, Comunidades do Rio ocupadas, e os Anéis das Olimpíadas. Imagens com reuso e modificação, para fins não-comerciais, autorizados.

Não quero me estender nesse tópico, mas, sinceramente, como um dos futuros expectadores dos Jogos, estou severamente preocupado com as Olimpíadas do Rio, a iniciarem-se em 4 de Agosto de 2016.

Mais do que com minha própria segurança, não consigo deixar de ver a falência de estratégias de Defesa e Segurança Nacional com décadas de bagagem, como é o caso da França, da Turquia (esta que, ao contrário da Europa, vive com a violência terrorista há muito tempo) e pensar: Como um país tão imaturo em, praticamente, tudo… Estamos prontos para enfrentar as ameaças externas e internas, à segurança e integridade de um “mini-mundo” a estadiar no Rio, pelos próximos 2 meses???
A França acaba de sofrer mais um atentado em seu território, e não faz nem um ano do Massacre na Casa de Shows de Paris. A Turquia lida com carros-bomba, regularmente. A estratégia de Defesa e Inteligência das duas nações (em especial, da França), está ano-luz do que engatinhamos por aqui. E não foi suficiente.

O Chefe do Estado Maior, Almirante Ademir Sobrinho, fez questão de demonstrar profunda tranquilidade com as informações disponíveis, e ratificou que as agências norte-americanas, europeias, e até Israel, trabalham ativamente com a ABIN e as Forças Armadas brasileiras, para detectar qualquer ameaça aos jogos. Mas, saberia a CIA, ou o Mossad, como monitorar as favelas da Maré, ou o Complexo do Alemão?
A pacificação do Rio falhou, miseravelmente, e basta ver o resgaste cinematográfico, recentemente perpetrado no Hospital do Rio, ver as faixas das organizações Policiais no saguão dos aeroportos, mais as recentes declarações de Eduardo Paes à jornais estrangeiros, para saber que, não: Não está tudo bem.

Polícia Interligada, Inteligência, Melhor armamento, Treinamento… É isso? Essa é a solução para a violência cotidiana, no Brasil?

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Foto: Wikipedia.org – Criança em lixão no Distrito Federal.

Não… Infelizmente, diferente dos vídeo-games de simulação, colocar delegacias, aumentar a verba da Segurança (Nacional e/ou Pública), abrir acadêmias de Inteligência… Nada disso; nada disso resolve o índice de “sucesso” do crime no Brasil.

A teoria básica para um Estado bem-sucedido, é fundada em três pilares:

  • Educação Pública, de qualidade, do fundamental ao médio (procurem os dados da nossa performance no PISA; é para morrer de desgosto).
  • Saúde Pública, Universalizada, ou, pelo menos, saúde privada, plenamente acessível (procurem o teste que o SUS idealizou [IDSUS] e em que ele mesmo não passou).
  • Segurança, em toda a sua complexidade e dimensão (releiam o post :-p ).

 

O Brasil é péssimo, em todos esses aspectos. Quero ver algum contra-argumento. Sério: Quero ver. Por favor, me animem com alguma boa notícia, em algum desses temas… É sério: Vou ficar grato.

Quando penso nas fileiras de candidatos às carreiras das Ciências exatas (famosas por gerar tecnologia, patentes, indústria, empregos)…
Quando penso no perfil estudantil da maior parte dos candidatos às carreiras de professorado (os piores alunos são esmagadora maioria dos que querem lecionar, no Brasil)…

Mas, principalmente, quando penso nos salários das profissões disponíveis para quem tem uma escolaridade tão triste, como a grande maioria da periferia… E comparo com o dinheiro (e o poder) que o tráfico e o crime oferecem à todos eles…
Colocando-me nos calçados (quando tem) de um menino, cujo pai é inexistente, e a mãe é uma viciada em crack; frequentando uma escola falida, com uma quadra esburacada, livros didáticos com erros de matemática, português, grafia de palavras… Professores com dificuldades de ler e compreender um texto…
Quando penso nesse menino… Nessa menina… Não consigo ver como pode o Estado Brasileiro; como pode a lei brasileira do Estado legítimo, ser o caminho escolhido para trilhar, desse futuro “projeto de problema social”.

Não: Não estou a fazer NENHUMA abonação, atenuação, ou sequer relativização sobre o certo e o errado: Obrigação de cada cidadão é de fazer o bem e ponto, independente da história de vida, pois, não existe Estado; não existe Nação, não existe nenhuma dessas construções sociais, sem a presença de cidadãos responsáveis, honestos, dedicados ao bem; exatamente o que esperam do país em que moram.

Mas, isto tudo dito e ratificado… Insisto que, não vejo como convencer um jovem engolido por esse mundo nefasto em que nasceu e cresceu, e como convencê-lo da validade de jamais desistir do bom caminho.

Afinal, diante da total privação de esperança, o homem deixa de temer o mal.

Nunca foi sensata a decisão de causar desespero nos homens, pois, quem não espera o bem, não teme o mal.

– Nicolau Maquiavel